quarta-feira, 1 de julho de 2015
AMOR DE PERDIÇÃO
Marco do Ultra-Romantismo português,
Amor de Perdição, publicado em 1862, foi muito bem-recebido pelo público em seu lançamento.
A obra é considerada uma espécie de Romeu e Julieta lusitano.
Camilo Castelo Branco pertence à Segunda
fase do Romantismo português, chamada Ultra-Romantismo – corrente literária da
segunda metade do século XIX que leva ao exagero os ideais românticos. Escreveu
vários gêneros de novelas: satíricas, históricas e de suspense. Mas foram suas
novelas passionais – como Amor de Perdição – que lhe deram maior projeção
dentro da literatura portuguesa.
Nesta novela passional, de temática
romântica exemplar, o escritor levou às últimas consequências a ideias de que o
sentimento deve sobrepor-se à vida e à razão.
O livro trata do amor impossível e
discute a oposição entre a emoção e os limites impostos pela sociedade à realização
da paixão. Sem conseguir o objeto da paixão, o herói romântico confirma seu
destino trágico. Nele, o mesmo amor que redime resulta em morte, conforme
antecipa o narrador-autor na introdução do livro, ao comentar o destino do seu
herói: “Amou, perdeu-se e morreu amando”.
1. UMA NOVELA ULTRA-ROMÂNTICA. Amor de Perdição é uma obra-prima do
Ultra-Romantismo português. Tem um narrador em primeira pessoa, que não
participa dos acontecimentos, mas conhece os fatos passados por “ouvir falar” e
“por pesquisar em documentos”. Conta a história do amor impossível dos jovens
Simão e Teresa, separados por rivalidades entre suas famílias – os Albuquerques
e os Botelhos, moradores da cidade de Viseu, em Portugal, e inimigos por questões
financeiras.
1a. A APOTEOSE DO SENTIMENTO. O corregedor Domingos Botelho e sua
mulher Rita Preciosa têm cinco filhos, entre eles Simão, que desde pequeno
demonstra um temperamento explosivo e indolente, e Manuel, calmo e ponderado. O
primeiro vai estudar em Coimbra depois de uma confusão doméstica, em que toma a
defesa de um criado da família. Lá, adota os ideais igualitários da Revolução
Francesa e acaba preso durante seis meses por badernas e arruaças. Quando sai
da cadeia, volta a Viseu, onde conhece e se apaixona por Teresa, sua vizinha
que tem 15 anos e é filha de uma família inimiga da sua. Com o objetivo de
separar Simão e Teresa, o pai da moça ameaça mandá-la para o convento, enquanto
Domingos Botelho envia Simão de volta a Coimbra. Uma velha mendiga faz o papel
de pombo-correio do casal, levando as cartas trocadas entre os dois jovens
apaixonados.
1b. A MUDANÇA DE SIMÃO. Movido pelo amor a Teresa, Simão decide se
regenerar e estudar muito. Nesse meio tempo, o irmão Manuel, que chegara a
Coimbra, foge para a Espanha com uma açoriana casada. A irmã caçula de Simão – Ritinha
– faz amizade com Teresa. O pai da heroína quer casá-la com o primo Baltasar
Coutinho – ordem que a moça se nega a cumprir. As intenções do pai de sua amada
fazem Simão retornar clandestinamente para Viseu, hospedando-se na casa do
ferreiro João da Cruz, antigo conhecido da família Botelho. Simão combina
encontrar-se às escondidas com Teresa no dia do aniversário da moça, mas o
encontro é transferido porque Teresa é seguida.
1c. AMOR E MORTE. Na data combinada, Simão vai ao encontro marcado
levando consigo o ferreiro João da Cruz e outros amigos. Depara-se com Baltasar
que, na companhia de alguns criados, fora até o local para matar Simão. Na
briga, dois dos criados de Baltasar são mortos. Ferido, Simão convalesce na
casa de João da Cruz. Teresa vai para um convento. Mariana, filha do ferreiro
apaixonada por Simão, empresta a ele suas economias para que vá atrás de
Teresa, dizendo que o dinheiro pertence à mãe do próprio Simão.
No dia previsto para que Teresa mude
de convento, Simão decide raptá-la. Dá-se um novo confronto com Baltasar
Coutinho, que leva um tiro na testa e morre.
Simão entrega-se à polícia e dispensa
a ajuda da família para sair da cadeia.
Levado a julgamento, é condenado à forca.
Enquanto isso, Mariana enlouquece de amor e a saúde de Teresa definha no
convento. Na cadeia, Simão passa os dias lendo e escrevendo cartas. João da
Cruz é assassinado pelo filho do criado de Baltasar Coutinho. Mariana, que
estava na cidade do Porto, volta a Viseu para tomar posse da herança, confiada
a Simão. Tardiamente, o pai de Simão pede que sua pena seja comutada em dez
anos de prisão, mas o filho rejeita a ajuda paterna.
Prefere o desterro para as Índias. Na
data em que a nau dos condenados parte, Teresa morre no convento. Ao saber da
morte de sua amada, Simão adoece, vindo a falecer no décimo dia de viagem.
Quando seu corpo é jogado ao mar, Mariana que o havia acompanhado, lança-se da
proa, suicidando-se abraçada à mortalha do amado.
PARA
LEMBRAR:
O narrador-autor
de Amor de Perdição conta fatos reais, romanceados a partir dos relatos de uma
tia que o criou. Preocupa-se em transcrever documentos para dar autenticidade às
aventuras que vai narrar. Essa preocupação do autor é um recurso romântico para
mobilizar e envolver o leitor com a intenção de comovê-lo.
1d. CENÁRIO EM MOVIMENTO. A novela passa em Portugal, no século XIX,
fase final do absolutismo, quando a Corte portuguesa experimentava as consequências
das invasões francesas determinadas por Napoleão. Em Amor de Perdição, o
deslocamento das personagens para as cidades de Viseu, Coimbra e do Porto
apenas reflete a complexidade das situações que as envolvem, não determinando
os acontecimentos. Ainda assim, as referências às cidades permitem uma visão
mais ampla da moral vigente e do provincianismo da sociedade portuguesa da época,
na qual a tradição de familiar e a preocupação com a reputação prevalecem sobre
o individualismo.
2. UM NARRADOR E VÁRIAS VOZES. Camilo Castelo Branco narra sua história
de maneira densa e ágil, intercalando, com maestria, a narração e os diálogos.
Sem deixar de afirmar o caráter verídico
dos fatos que descreve, o narrador-autor assume que se vale mais da memória do
que da realidade dos fatos. Utiliza-se também, ao mesmo tempo, de inúmeros
documentos para afastar dúvidas quanto à credibilidade do que descreve,
posicionando-se como contador de fatos já ocorridos. “Já lá se vão cinquenta e
sete anos (...)”, diz a carta de tia Rita.
Ao relatar a forma como conseguiu os
documentos para reconstituir “a triste história de meu tio paterno Simão
Botelho”, o narrador está com o foco centrado na primeira pessoa. Assim que começa
a descrever os fatos ocorridos a cada um dos personagens, torna-se um narrador
em terceira pessoa.
2a. AMOR POR CORRESPONDÊNCIA. As cartas trocadas entre os dois jovens
protagonistas apaixonados, incluídas no livro, são um importante recurso retórico
usado pelo escritor e que intensifica o teor passional e dramático da história.
Trazendo emoções e confissões de Simão
e Teresa, os textos das cartas os transformam também em narradores. Amor de
Perdição é, portanto, uma obra que possui múltiplas vozes narrativas.
Também se destaca na obra o
personalismo do narrador-autor, que volta e meia interfere para julgar ou
ponderar – mostrando comoção ou indignação, porém sem se alongar demais nas suas
digressões a ponto de prejudicar a ação.
3. AÇÃO EM ORDEM CRONOLÓGICA. Em Amor de Perdição, os acontecimentos
se desenrolam de uma maneira bastante linear e em ordem cronológica,
privilegiando a ação em vez da descrição.
Exemplar no gênero novela passional, a
obra tem uma única trama central – a infeliz história de amor entre Teresa e
Simão, repleta de desavenças, infortúnios, crimes, mortes, fugas e tentativas de
rapto -, em torno da qual se movimentam as demais personagens.
3a. UMA LINGUAGEM POPULAR. O próprio Castelo Branco justifica o sucesso
de seu romance: “Rapidez das peripécias, a derivação concisa do diálogo para
pontos essenciais do enredo, a ausência de divagações filosóficas, a lhaneza de
linguagem e o desartifício das locuções”. Essa explicação está incluída no prefácio
da segunda edição da novela, desdenhada pelo autor, no início, por tê-la
produzido em apenas 15 dias, no período em que ficou preso.
Embora tenha escrito febrilmente para
sustentar a família e produzido, certa vez, quatro livros ao mesmo tempo,
Camilo Castelo Branco manteve sempre o cuidado estilístico e a preocupação com a
pureza da linguagem. Se, às personagens mais populares, emprestava uma fala
viva e espontânea, aos protagonistas burgueses reservava uma retórica mais
sentimental e trágica.
4. PERSONAGENS SEM CONTRADIÇÕES. O mundo romântico é idealizado,
povoado de personagens virtuosas e sem contradições. Nesse contexto, podem-se
contrapor às regras sociais, mas são sempre guiadas por seus sentimentos. Amor
de Perdição tem três personagens principais: Simão, Teresa e Mariana. Embora
pertençam a classes sociais diferentes – Simão e Teresa são burgueses, enquanto
Mariana é filha do camponês João da Cruz -, a distinção se perde porque o que vale,
na novela e no romance romântico, é a nobreza das emoções, permitindo que sua
firmeza de caráter sobressaia.
4a.
SIMÃO ANTÔNIO BOTELHO: O HERÓI ROMÂNTICO. Se muito do que é relatado em Amor de
Perdição tem seu fundo de verdade – todos os Botelhos citados na narrativa são
realmente parentes do autor por parte de pai -, o herói romântico é,
confessadamente, enriquecido pela imaginação do autor. O Simão real, segundo um
biógrafo, era pouco e um bagunceiro em Coimbra, até ser degredado para a Índia
em 1807, sem que se tivessem mais notícias dele depois. Já o Simão de Camilo
Castelo Branco ainda jovem tem ideais revolucionários, mostrados claramente quando
ele se rebela contra a mentalidade escravocrata de sua família, cena descrita
no primeiro capítulo.
Essencialmente romântico, e muito
inspirado na vida do próprio autor, o herói tenta seguir a ordem estabelecida
para ter o amor de Teresa, desejo que se mostra impossível. Sem obter
resultado, Simão parte para uma espécie de extremismos emocionais, como a
tentativa de rapto que culmina em mortes. Defensor das ideias liberais, tem
nobreza de caráter. Tanto que se entrega à polícia depois de dar vazão ao seu
lado colérico, quando mata Baltasar Coutinho.
4b. TERESA DE ALBUQUERQUE: A HEROÍNA ROMÂNTICA. A frágil Teresa opõe-se
firmemente ao destino que a família quer lhe impor Mas se vê obrigada a cumprir
as ordens do pai, o dominador Tadeu de Albuquerque. Obstinada e apaixonada,
luta para não se casar com o primo Baltasar Coutinho e troca cartas com Simão,
na tentativa de acalmar a chama da paixão.
Marginalizada e enclausurada num
convento, reflete a fé na justiça divina e as injustiças cometidas em função
dos preconceitos da época, que se interpunham entre ela e a felicidade não
realizada.
4c. MARIANA: A AMANTE SILENCIOSA. Mulher mais velha, de 24 anos, criada
no campo, Mariana pertence a uma classe social mais popular. Dela o narrador
diz ter “formas bonitas” e um rosto “belo e triste”, para realçar a grandeza de
seu amor-renúncia. O desprendimento que mostra - mando Simão em silêncio e, por
isso, ajudando-o a se aproximar da felicidade pela figura representada pela
figura de Teresa – faz parte do ideário romântico. Abnegada e fiel, Mariana jamais
diz uma palavra e controla obstinadamente seu ciúme. Na história de Camilo
Castelo Branco, é a personagem que mais sofre no romance. Pode-se dizer que a
obra existe uma tríade romântica – Simão, Mariana e Teresa. Os três nunca se
realizam sentimentalmente e têm um final trágico.
4d. JOÃO DA CRUZ: O CAMPONÊS RÚSTICO. Personagem popular, é um camponês
que se transforma no protetor do jovem Simão quando este volta à cidade de
Viseu, atrás de Teresa. A princípio, cuida do jovem em retribuição ao pai de
Simão, que outrora o livrara de uma complicação judicial. Mas depois acaba
gostando tanto de Simão a ponto de matar para defender o rapaz.
4e. BALTASAR COUTINHO: O BURGUÊS INTERESSEIRO. É o primo de Teresa,
rapaz sem moral e sem brios, que não ama a moça, mas está disposto a recorrer a
quaisquer expedientes para vencer a disputa com Simão. Faz o contraponto com o
herói, na medida em que ambos vêm de famílias abastadas. Mas enquanto Simão se
move pelos mais nobres sentimentos, Baltasar é norteado por intenções medíocres.
4f. TADEU DE ALBUQUERQUE: O AUTORITÁRIO. É o pai de Teresa, que a todo
momento toma o destino da moça nas mãos, sem respeitar seus sentimentos. Por
uma rivalidade particular com a família de Simão, decide impedir a felicidade
da filha, criando vários empecilhos para afastá-la de seu amor.
4g. MANUEL BOTELHO, O IRMÃO DESMIOLADO. O jovem irmão de Simão – que
inicialmente critica o protagonista por sua vida desordenada – envolve-se com
uma mulher casada na época em que vai morar com Simão na cidade de Coimbra.
Arrependido, confirma sua dependência familiar quando pede ajuda aos pais para
devolver aos Açores a mulher casada com quem havia fugido.
ANOTE!
As personagens do Romantismo vivem em
conflito com a sociedade, que impõe limites à realização de seus desejos. No
caso de Amor de Perdição, o obstáculo a ser superado é a família, tanto da de
Teresa quanto a de Simão.
As personagens do Realismo vivem em contradição
consigo mesmas e coma sua visão do mundo.
5. AS NOVELAS CAMILIANAS. Embora Camilo Castelo Branco classificasse
suas obras como romances, os críticos literários referem-se a elas como
novelas. A diferença essencial está no tratamento linear da narrativa, nas
cenas sucessivas e na conclusão fechada. Os romances abordam um mundo
multifacetado, com personagens mais complexas e contraditórias.
Nas novelas passionais do autor, o
tema central é amor, exacerbação do sentimento que leva à ruptura com os padrões
de comportamento e as regras sociais: a transgressão norteada pelos mais nobre
dos sentimentos: a paixão que justifica toda a sorte de condutas, como o enlouquecimento
– no caso de Mariana, a apaixonada que ama Simão em silêncio; a clausura – de Teresa,
enviada para um convento pelo pai para afastá-la de seu amor; e a transformação
de um homem de bem em criminoso – como o assassinato cometido por Simão. São
histórias curtas que relatam, quase sempre, a luta entre o bem e o mal.
ANOTE!
Em suas novelas passionais, Camilo
Castelo Branco explora a contradição entre o eu – que quer guiar-se pelos
sentimentos – e os limites sociais que tentam impedir a concretização desses
sentimentos. Tudo isso passa num mundo cheio de personagens que são moldadas de
forma maniqueísta, voltadas para o bem ou para o mal, sem se desviar de seus propósitos.
6. UM APAIXONADO DO CETICISMO. Inscrito na segunda fase do Romantismo
português – a corrente literária classificada de Ultra-Romantismo -, Camilo
Castelo Branco opta pela abordagem dos sentimentos em vez de voltar-se para a
questão do nacionalismo, uma característica que marcou vários autores na
primeira fase do Romantismo em vários países europeus, inclusive Portugal. A
grande interrogação de Camilo Castelo Branco é; até que ponto o homem pode se valer
dos sentimentos para guiar sua existência?
PARA
LEMBRAR
O Romantismo surgiu na primeira metade
do século XIX, condicionado pelo fenômeno de ascensão da burguesia, provocado
pela Revolução Francesa e consolidado com as Revoluções Liberais de 1830 e
1848. É uma reação ao universalismo neoclássico, propondo uma literatura
subjetiva e individualista.
O exagero desse individualismo, o tédio
e o ceticismo diante da existência criam a sensação indefinida de insatisfação,
a que os românticos davam o nome de “Mal do Século”. A dificuldade em
distinguir o sonho da realidade; o nacionalismo e a valorização do passado; o
desejo de reforma e o engajamento político caracterizam a literatura romântica.
O romance romântico aborda a temática do amor nas suas formas mais exaltadas,
acima do controle da razão e inevitavelmente ligada à morte, como se vê nesta
obra de Camilo Castelo Branco.
7. OPOSIÇÃO AO REALISMO. Amor de Perdição, publicado em 1862, é anterior
ao início do Realismo em Portugal, que só começa em 1865, com as polêmicas
Conferências do Cassino Lisbonense e as discussões que redundaram na chamada
Questão Coimbrã. Camilo opunha-se ao romance realista, julgando-o imoral.
Criticava-o por retratar pessoas fúteis ou que premeditam crimes, que
desorganizam famílias: padres que rompem o celibato e alterações sexuais. O
escritor rejeitava esses temas em favor da apologia do sentimento. Sobre o
Realismo, afirmou: “(...) Quero escrever romances para as pessoas lerem na
sala, não nos quartos de banho. Quero escrever romances para que todas as
pessoas da família possam ler: as moças mais jovens, as senhoras
(...)”.
8. O ROMANTISMO EM PORTUGAL. O Romantismo chega a Portugal no momento
em que o país vivia uma das suas mais graves crises sociais e políticas.
Dividido entre o absolutismo de Dom Miguel e o liberalismo de Dom Pedro IV – Dom
Pedro I no Brasil -, a nação portuguesa se viu envolvida numa violenta guerra
civil entre os anos de 1832 e 1834. Os liberais – defensores de uma monarquia
constitucional – representavam os interesses da burguesa capitalista emergente contra
as detentoras dos bens feudais, representado por Dom Miguel. A revolução romântica
alimenta-se, em Portugal, dessa revolução social e política. Os primeiros
escritores românticos portugueses – Almeida Garrett (1799-1854) e Alexandre
Herculano (1810-1877) – participam ativamente da revolução liberal e, após sua
vitória, em 1834, retornam do exílio para implantar em Portugal a nova
literatura romântica.
8a. AS GERAÇÕES ROMÂNTICAS. Costuma-se dividir o Romantismo português
em três gerações. A primeira – entre 1825 e 1840 – caracteriza-se pela luta
pelo liberalismo e pela libertação das amarras neoclássicas. Tem em Almeida
Garrett e Alexandre Herculano seus principais representantes. Na Segunda geração
– entre 1840 e 1860 -, prevalece o passionalismo e sobressai a figura ultra-romântica
de Camilo Castelo Branco. Na terceira – de 1860 -, representada por Júlio Dinis
(1869-1871), é marcada a fase de transição para o Realismo da década de 70.
VIDA
E OBRA:
O
MAIS ROMÂNTICO DOS ROMÂNTICOS
A vida de Camilo Castelo Branco
(1825-1890) parece Ter sido copiada de uma de suas novelas passionais. Aos dois
anos fica órfão de mãe. Aos dez perde o pai. Criado por uma tia e pela irmã, recebe
educação religiosa. Aos 16 anos, casa-se com Joaquina Pereira, de apenas 15.
Desse primeiro casamento – logo esquecido – tem uma filha, que morre aos cinco
anos. Entre os anos de 1843 e 1846, tenta, sem sucesso, formar-se em Medicina
na cidade do Porto e de Coimbra.
Entretanto, parece mais inclinado à boêmia
e ao escândalo. Em 1846, é preso por raptar a jovem Patrícia Emília, com quem
tem outra filha. Em 1847, fica viúvo de Joaquina Pereira. Trava um duelo com um
dos filhos de Maria Felicidade Brown, e passa a ter um caso com ela.
1. UMA SUCESSÃO DE TRAGÉDIAS. Em 1850, conhece Ana Plácido, por quem
se apaixona.
Quando ela se casa com o brasileiro
Pinheiro Alves, o autor entra para o Seminário do Porto, buscando refúgio na
religião. Mantém, então, um escandaloso caso amoroso com a freira Isabel Cândida.
Em 1859, Ana Plácido abandona o marido e vai viver com o escritor. Perseguidos
pela justiça, os dois passam um ano da Cadeia da Relação, na cidade do Porto.
Data desse período de encarceramento a redação de sua maior novela passional – Amor
de Perdição -, inspirada nas suas próprias desventuras e na peça Romeu e
Julieta, do escritor inglês William Shakespeare. Com a publicação da novela, em
1862, o escritor alcança grande popularidade.
O casal muda-se para São Miguel de
Seide. Camilo Castelo Branco, então, passa a escrever para sobreviver. O irônico
Coração, Cabeça e Estômago (1862) e Amor de Salvação (1864) estão entre as
melhores obras escritas nesse período. Vários episódios trágicos continuam a
perseguir o escritor. Um deles é a loucura de seu filho Jorge. O outro, a
cegueira que começa a se manifestar no autor em 1867, consequência de uma sífilis
contraída na juventude e mal curada. Em 1890, Camilo Castelo Branco coloca um
ponto-final em sua maior novela passional. Mata-se com um tiro de pistola.
Principais
obras: Carlota Ângela (1858), Amor de Perdição (1862), Coração, Cabeça e Estômago
(1862), Amor de Salvação (1864), A Queda dum Anjo (1866), A Doida do Candal
(1867), Novelas do Minho (1875-
77), Eusébio Macário (1879), A Corja
(1880), A Brasileira de Prazins (1882)
GLOSSÁRIO
Açoriana: natural ou
habitante dos Açores.
Desterro: ato ou efeito de
desterrar; banimento.
Ideário: conjunto ou
sistema de ideias políticas, sociais e econômicas.
Lhaneza: franqueza,
sinceridade, lisura.
Tríade: conjunto de três
pessoas ou três coisas; trindade, trilogia.
Esse estudo foi apresentado na edição
do livro vendida pelo jornal O Estado de São Paulo a seus assinantes.
Amor de Perdição é novela passional.
Luiz Antônio da Silva*
Especial para o Fuvest
Camilo Castelo Branco conquistou fama
com a novela passional Amor de Perdição. Bem ao gosto romântico, a característica
principal da novela passional é o seu tom trágico. As personagens estão sempre
em luta contra terríveis obstáculos para alcançar a felicidade no amor.
Normalmente, essa busca é frustrante.
Mesmo quando os amantes ficam juntos, isso é conseguido a custa de muito
sofrimento. Os direitos do coração, frequentemente, vão de encontro aos valores
sociais e morais. Segundo o autor, Amor de Perdição foi escrito em 15 dias em
1861, quando ele estava preso na cadeia da Relação, na cidade do Porto, por
ter-se envolvido em questões de adultério.
Como o drama de Romeu e Julieta, a
obra focaliza dois apaixonados que têm como obstáculo para a realização amorosa
a rivalidade entre as famílias. A ação se passa em Portugal, no século19. O
narrador diz contar fatos ocorridos com seu tio Simão. Residentes em Viseu,
duas famílias nobres, os Albuquerques e os Botelhos, odeiam-se por causa de um
litígio em que o corregedor Domingos Botelho deu ganho de causa contrário aos
interesses dos primeiros. Simão é um dos cinco filhos do corregedor.
Devido ao seu temperamento explosivo,
Simão envolve-se em confusões. Seu pai o manda estudar em Coimbra, mas ele se
envolve em novas confusões e é preso. Liberto, volta para Viseu e se apaixona
por Teresa Albuquerque, sua vizinha.
A partir daí, opera-se uma rápida transformação
no rapaz. Simão se regenera, torna-se estudioso, passa a ter como valor maior o
amor, e todos os seus princípios são dele decorrentes. Os pais descobrem o
namoro.
O corregedor manda o filho para
Coimbra. Para Teresa restam duas opções: casar-se com o primo Baltasar ou ir
para o convento. Proibidos de se encontrar, os jovens trocam correspondência,
ajudados por uma mendiga e por Mariana, filha do ferreiro João da Cruz. Mariana
encarna o amor romântico abnegado.
Apaixona-se por Simão, embora saiba
que esse amor jamais poderá ser correspondido, seja pelo fato de Teresa dominar
o coração do rapaz seja pela diferença social: ela era de condição humilde, filha
de um ferreiro. Mesmo assim, ama a tal ponto de encontrar felicidade na
felicidade do amado.
Depois de ameaças e atentados, Teresa
rejeita o casamento. Por isso será enviada para o convento de Mon-chique, no
Porto. Simão resolve raptá-la, acaba por matar seu rival e se entrega à polícia.
João da Cruz oferece-se para ajudá-lo a fugir, mas ele não aceita, pois é o típico
herói romântico.
Matou por amor à Teresa, portanto
assume seu ato e faz questão de pagar. Enquanto Simão vai para a cadeia, sua
amada vai para o convento. Mariana, por sua vez, procura estar sempre ao lado
de Simão, ajudando-o em todas as ocasiões. Condenado à forca, a sentença é comutada
e Simão é degredado para a Índia.
Quando ele está partindo, Teresa,
moribunda, pede que a coloquem no mirante do convento, para ver o navio que
levará seu amado para longe. Após acenar dizendo adeus, morre. Seu amor
exagerado a leva à perdição.
Durante a viagem, Mariana, que
acompanha Simão, mostra-lhe a última carta de Teresa. Ele fica sabendo da sua
morte, tem uma febre inexplicável e morre. Seu amor exagerado o leva à perdição.
Na manhã seguinte, seu corpo é lançado ao mar. Mariana não suporta a perda e se
joga ao mar, suicidando-se abraçada ao cadáver de Simão. Seu amor exagerado a
leva à perdição.
FICHA
Estilo: pertence à época
romântica
Gênero: novela passional
Foco
Narrativo: Embora na "Introdução" narrador e autor se
confundam, os fatos são narrados em 3ª pessoa.
Tempo
e Espaço: Portugal (Viseu, Coimbra e Porto), século 19.
Personagens: Simão
Botelho, Teresa Albuquerque, Mariana, Baltasar, Domingos Botelho, Tadeu Albuquerque, João
da Cruz, D. Rita Castelo Branco
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