"Olhai para os lírios do campo, como eles crescem; não trabalham, nem fiam. E eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles".

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

O verbo "ver" conjugado no futuro do subjuntivo

“Se você vir um deputado...”

Assim escreveu mestre Caetano, na letra da genial Haiti. Na terna Bem-querer, outro mestre, Chico Buarque, escreveu “Quando meu bem querer me vir, estou certa que há de vir atrás...”.
Pois bem. Todos sabem que há uma grande diferença entre a chamada norma culta da língua e aquilo que se usa no padrão coloquial. Mas há consenso em relação a muitos pontos. Ninguém aceita, por exemplo, nem na linguagem oral, que se diga “Se ela ir”, ou “Se você dizer”, ou ainda “Se alguém fazer”. Com o verbo “ver”, porém, a coisa é diferente. Raríssimos são os brasileiros, letrados ou iletrados, com teto ou sem teto, que sabem conjugar o futuro do subjuntivo desse bendito verbo. Talvez isso se deva a uma boba resistência à semelhança entre vir, do verbo ver, e vir, do verbo vir.
Antes que alguém se sinta mal com o nome do tempo verbal (as pessoas têm incrível aversão à nomenclatura gramatical), vale lembrar, numa explicação quase simplória, que o futuro do subjuntivo é aquele tempo que se usa com “se” ou “quando”, em frases como “Se/Quando você quiser”, ou “Se/Quando ela souber” etc. Vale lembrar também que o subjuntivo é o modo que indica fato hipotético, provável, duvidoso.
Não é difícil entender por que de “ver” surge a forma “vir”. O futuro do subjuntivo obedece a um sistema de conjugação válido para absolutamente todos os verbos da língua portuguesa. E esse sistema é muito simples. De onde vem a forma “for”, do verbo ir (“Se eu for ao cinema”)? Vem da mesma raiz de “foram”, do pretérito perfeito (“Ontem eles foram ao cinema”).
Basta eliminar as duas últimas letras (am), e pronto! Está feita a primeira pessoa do singular do futuro do subjuntivo do verbo ir (foram − am = for).
Esse sistema vale para 101% dos verbos da língua portuguesa. Tente com outro. Fazer, por exemplo: “Ontem eles fizeram o trabalho”. Faça a operação: fizeram − am = fizer. Então “Quando/Se eu fizer...”.
Vejamos com o verbo dar: “Ontem eles deram a resposta”. Elimine as duas últimas letras de “deram”. (deram − am = der): “Se/Quando eu der a resposta...”.
É bom lembrar que a primeira e a terceira do singular do futuro do subjuntivo são sempre iguais (Se/Quando eu for, Se/Quando ele for; Se/Quando eu fizer, Se/Quando ele fizer).
Agora vamos ao bendito verbo ver: “Ontem eles viram o filme”. Muito bem. Se você eliminar as duas últimas letras de “viram”, o que sobra?
Faça você mesmo: viram − am = vir. Então, “Se/Quando eu vir o filme...”; “Se/Quando você vir minha prima...”
No Brasil, esse verbo apanha. E o pobre verbo vir também apanha. Na linguagem oral, quase todos os brasileiros dizem “Se você me ver lá”. E, conjugando o verbo vir, muitas pessoas dizem “Se você vir aqui amanhã”, em vez de “Se você vier aqui amanhã”. A combinação correta dos dois verbos, em uma frase como “Se eu vier aqui amanhã e vir você mexendo nas minhas coisas...”, então, chega a ser meta inatingível.
Já em Portugal, qualquer cidadão conjuga o verbo ver no futuro com a maior naturalidade. Ilustra isso uma memorável cena que presenciei no aeroporto de Lisboa, no momento do embarque para São Paulo. Um nosso compatriota insistia em fotografar o avião. Um guarda do aeroporto impediu-o, “por questão de segurança”. Quando o guarda virou as costas, nosso patrício, mais do que depressa, armou a máquina e... foi novamente impedido pelo guarda, mais rápido do que ele e acostumado à esperteza dos brasileiros. Instalou-se o bate-boca. A certa altura, o teimoso disse:
— “Mas eu não vou poder mesmo fotografar o avião?”
— “Só se eu não vir”, disse o guarda.
— “Mas o senhor vem toda hora!”
Sem comentário.

Até a próxima. Um forte abraço.


Pasquale Cipro Neto

Confira os 10 erros gramaticais

Erros gramaticais e ortográficos devem, por princípio, ser evitados. Alguns, no entanto, como ocorrem com maior freqüência, merecem atenção redobrada. Veja a lista com dez entre os mais comuns do idioma e use esta relação como um roteiro para fugir deles.

1 - "Fazem" cinco anos. O verbo “fazer”, quando exprime tempo, é impessoal. Isto significa que o verbo, neste caso, não se flexiona para o plural.
Ex.: Faz cinco anos. / Fazia dois séculos. / Fez 15 dias.


2 - Preferia ir "do que" ficar. Prefere-se sempre uma coisa a outra: Preferia ir a ficar. É preferível segue a mesma norma: É preferível lutar a morrer sem glória.


3 - Vive "às custas" do pai. O certo: Vive à custa do pai. Use também em via de, e não "em vias de".
Ex.: Espécie em via de extinção. / Trabalho em via de conclusão.


4 - Não sabiam "aonde" ele estava. O correto seria: Não sabiam onde ele estava. Aonde se usa apenas com verbos de movimento: Não sei aonde ele quer chegar. / Aonde vamos?

5 - "Cerca de 18" pessoas o saudaram. "Cerca de" indica arredondamento e não pode aparecer com números exatos.
Ex.: Cerca de 20 pessoas o saudaram.


6 - Blusa "em" seda. Usa-se de, e não em, para definir o material de que alguma coisa é feita. Ex.: Blusa de seda, casa de alvenaria, medalha de prata, estátua de madeira.


7 - Não "se o" diz. É errado juntar o se com os pronomes o, a, os e as. Assim, nunca use: Fazendo-se-os, não se o diz (não se diz isso), vê-se-a, etc.


8 - A promoção veio "de encontro aos" seus desejos. "Ao encontro de" é que expressa uma situação favorável: A promoção veio ao encontro dos seus desejos. De encontro a significa condição contrária: A queda do nível dos salários foi de encontro às (foi contra) expectativas da categoria.


9 - Já "foi comunicado" da decisão. Uma decisão é comunicada, mas ninguém "é comunicado" de alguma coisa. Assim: Já foi informado (cientificado, avisado) da decisão. Outra forma errada: A diretoria "comunicou" os empregados da decisão. Opções corretas: A diretoria comunicou a decisão aos empregados. / A decisão foi comunicada aos empregados.


10 - O fato passou "desapercebido". Na verdade, o fato passou "despercebido", não foi notado. Desapercebido significa desprevenido.

A Metamorfose

....A metamorfose, de Franz Kafka, foi escrito em 1912, quando o autor contava vinte e nove anos. É um de seus poucos romances que foram finalizados e publicados, e é marcado pela sua forma peculiar de compor literatura.
....A fórmula é bastante simples: Gregor Samsa acorda certa manhã, após "sonhos intranqüilos", e se encontra metamorfoseado em um inseto monstruoso. A partir daí passa a viver uma nova rotina, na qual deve permanecer em casa e à distância de qualquer visita. O trabalho, obviamente, é abandonado e seu quarto se transforma em todo o seu mundo.
....Aos poucos todos se acostumam com a nova forma de Gregor, e todos convivem com ela, cada um ao seu jeito. Ao final, com a morte do grande inseto, todos se aliviam. O livro termina com a família, aliviada, reservando um dia para descanso e para passeio. Algo como um prêmio depois do calvário que foi conviver com situação tão inusitada.
....O final da estória, a certa altura, é completamente previsível. Mas a leitura, parágrafo por parágrafo, página por página, é saborosa e gratificante. É como se o final fosse já conhecido, porém cada passo contivesse algo de potencialmente novo ou surpreendente.
....A estória de Samsa impressiona pela alegoria associada à vida de um homem comum que exerce atividades burocráticas. O termo "kafkiano", associado a tudo que é inusitado, surgiu das situações em que Gregor aparece contemplativo, em sua nova situação, observando desde seu novo ponto de vista as pessoas e o mundo que o rodeia.
....Conta-se que o autor, quando chegava em casa depois do trabalho, em sua essência um conjunto de rotinas burocráticas e burocratizantes, deitava-se no sofá da sala e comentava que se sentia como um grande inseto, referindo-se às limitações impostas ao uso de sua criatividade.
....O grande inseto, deitado em sua cama, esperneava e remexia-se tentando voltar à posição natural, com as asas para cima e as pernas para baixo, na qual teria domínio de seus movimentos. O autor, em sua literatura, tentava rebelar-se contra as imposições da sociedade.
....O clima mantido por Kafka antecipa as situações de outras de suas obras, em grande parte inacabadas, em que é caracterizado um ambiente de angústia e de desconcerto, atribuído por muitos ao início da era que culminaria com a ascensão de Hitler e com a Segunda Guerra Mundial.
....A metamorfose é uma obra de literatura fantástica na medida em que explora uma situação inusitada e que foge ao que é aceitável ou palatável. Bem que poderia ser classificada como ficção científica, mas não há explicações mais detalhadas sobre a transformação do homem em inseto. O certo é que a estória de Gregor Samsa transcende essas classificações e denuncia os mecanismos de dominação e de subjugação da mente humana.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O Homem Nu

Ao acordar, disse para a mulher:
— Escuta, minha filha: hoje é dia de pagar a prestação da televisão, vem aí o sujeito com a conta, na certa. Mas acontece que ontem eu não trouxe dinheiro da cidade, estou a nenhum.
— Explique isso ao homem — ponderou a mulher.
— Não gosto dessas coisas. Dá um ar de vigarice, gosto de cumprir rigorosamente as minhas obrigações. Escuta: quando ele vier a gente fica quieto aqui dentro, não faz barulho, para ele pensar que não tem ninguém. Deixa ele bater até cansar — amanhã eu pago.
Pouco depois, tendo despido o pijama, dirigiu-se ao banheiro para tomar um banho, mas a mulher já se trancara lá dentro. Enquanto esperava, resolveu fazer um café. Pôs a água a ferver e abriu a porta de serviço para apanhar o pão. Como estivesse completamente nu, olhou com cautela para um lado e para outro antes de arriscar-se a dar dois passos até o embrulhinho deixado pelo padeiro sobre o mármore do parapeito. Ainda era muito cedo, não poderia aparecer ninguém. Mal seus dedos, porém, tocavam o pão, a porta atrás de si fechou-se com estrondo, impulsionada pelo vento.
Aterrorizado, precipitou-se até a campainha e, depois de tocá-la, ficou à espera, olhando ansiosamente ao redor. Ouviu lá dentro o ruído da água do chuveiro interromper-se de súbito, mas ninguém veio abrir. Na certa a mulher pensava que já era o sujeito da televisão. Bateu com o nó dos dedos:
— Maria! Abre aí, Maria. Sou eu — chamou, em voz baixa.
Quanto mais batia, mais silêncio fazia lá dentro.
Enquanto isso, ouvia lá embaixo a porta do elevador fechar-se, viu o ponteiro subir lentamente os andares... Desta vez, era o homem da televisão!
Não era. Refugiado no lanço da escada entre os andares, esperou que o elevador passasse, e voltou para a porta de seu apartamento, sempre a segurar nas mãos nervosas o embrulho de pão:
— Maria, por favor! Sou eu!
Desta vez não teve tempo de insistir: ouviu passos na escada, lentos, regulares, vindos lá de baixo... Tomado de pânico, olhou ao redor, fazendo uma pirueta, e assim despido, embrulho na mão, parecia executar um ballet grotesco e mal ensaiado. Os passos na escada se aproximavam, e ele sem onde se esconder. Correu para o elevador, apertou o botão. Foi o tempo de abrir a porta e entrar, e a empregada passava, vagarosa, encetando a subida de mais um lanço de escada. Ele respirou aliviado, enxugando o suor da testa com o embrulho do pão.
Mas eis que a porta interna do elevador se fecha e ele começa a descer.
— Ah, isso é que não! — fez o homem nu, sobressaltado.
E agora? Alguém lá embaixo abriria a porta do elevador e daria com ele ali, em pêlo, podia mesmo ser algum vizinho conhecido... Percebeu, desorientado, que estava sendo levado cada vez para mais longe de seu apartamento, começava a viver um verdadeiro pesadelo de Kafka, instaurava-se naquele momento o mais autêntico e desvairado Regime do Terror!
— Isso é que não — repetiu, furioso.
Agarrou-se à porta do elevador e abriu-a com força entre os andares, obrigando-o a parar. Respirou fundo, fechando os olhos, para ter a momentânea ilusão de que sonhava. Depois experimentou apertar o botão do seu andar. Lá embaixo continuavam a chamar o elevador. Antes de mais nada: "Emergência: parar". Muito bem. E agora? Iria subir ou descer? Com cautela desligou a parada de emergência, largou a porta, enquanto insistia em fazer o elevador subir. O elevador subiu.
— Maria! Abre esta porta! — gritava, desta vez esmurrando a porta, já sem nenhuma cautela. Ouviu que outra porta se abria atrás de si.
Voltou-se, acuado, apoiando o traseiro no batente e tentando inutilmente cobrir-se com o embrulho de pão. Era a velha do apartamento vizinho:
— Bom dia, minha senhora — disse ele, confuso. — Imagine que eu...
A velha, estarrecida, atirou os braços para cima, soltou um grito:
— Valha-me Deus! O padeiro está nu!
E correu ao telefone para chamar a radiopatrulha:
— Tem um homem pelado aqui na porta!
Outros vizinhos, ouvindo a gritaria, vieram ver o que se passava:
— É um tarado!
— Olha, que horror!
— Não olha não! Já pra dentro, minha filha!
Maria, a esposa do infeliz, abriu finalmente a porta para ver o que era. Ele entrou como um foguete e vestiu-se precipitadamente, sem nem se lembrar do banho. Poucos minutos depois, restabelecida a calma lá fora, bateram na porta.
— Deve ser a polícia — disse ele, ainda ofegante, indo abrir.
Não era: era o cobrador da televisão.
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Fernando Sabino. Extraída do livro de crônicas de Fernando Sabino, Editora do Autor - Rio de Janeiro, 1960, pág. 65.

domingo, 14 de dezembro de 2008

Faça uma varredura em seu nome...

Vejam que interessante!

Com a evolução dos bancos de dados e dos grandes portais de busca na internet, quaisquer publicações que sejam feitas envolvendo o nome de determinada pessoa e que venham a ser indexadas na grande rede mundial de computadores podem ser detectadas em poucos segundos.
Para isto, basta acessar o portal de busca, o Google, por exemplo, http://www.google.com.br/, digitar [no browser o nome da pessoa a ser pesquisada entre aspas] e pronto. Estará tudo lá. Surgirá na tela do monitor, dependendo da atividade que a pessoa exerça, da exposição do nome desta na grande mídia, ou da interação que tenha com o mundo da informática, a relação de links em que o nome aparece sendo citado.
Mas, é importante que a pessoa digite o nome a ser pesquisado entre aspas, caso contrário a relação informará links cujos nomes, por serem semelhantes quanto ao montante parcial de vocábulos, acabará por estender muito e desnecessariamente a pesquisa.

Existe também a possibilidade de se fazer uma varredura no nome de pessoas através de informações mais detalhadas, como por exemplo, utilizando-se do número do CPF (ou de outros documentos pessoais) desta, do nome da entidade de classe a qual ela esteja afiliada, da instituição a qual ela tenha algum vínculo, etc. Mas isto já é um procedimento mais complexo... Coisa para os detetives profissionais, não é mesmo? Rss...

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Porque ninguém é de ferro... uma piadinha de leve!

Joãozinho, a professora e o diretor
.
A professora estava tendo dificuldades com um dos alunos. (adivinha quem?)
- Joãozinho qual é o seu problema?
- Sou muito inteligente para estar no primeiro ano. Minha irmã está no terceiro ano e eu sou mais inteligente do que ela. Eu quero ir para o terceiro ano também.
A professora, vendo que não vai conseguir resolver este problema, o manda para a diretoria.
Enquanto o Joãozinho espera na ante-sala, a professora explica a situação ao diretor.
O diretor diz para a professora que vai fazer um teste com o garoto.
Como é certo que ele não vai conseguir responder a todas as perguntas, vai mesmo ficar no primeiro ano. A professora concorda. Chama o Joãozinho e explica-lhe que ele vai ter que passar por um teste e o menino aceita.
O Diretor pergunta para o Joãozinho:
- Joãozinho, quanto é 3 vezes 3?
- 9.
- E quanto é 6 vezes 6?
- 36.
O diretor continua com a bateria de perguntas que um aluno do terceiro ano deve saber responder. Joãozinho não comete erro algum. O diretor então, diz para a professora:
- Acho que temos mesmo que colocar o Joãozinho no terceiro ano.
A professora diz:
- Posso fazer algumas perguntas também?
O diretor e o Joãozinho concordam. A professora pergunta:
- O que é que a vaca tem quatro e eu só tenho duas?
Joãozinho pensa um instante e responde:
- Pernas.
Ela faz outra pergunta:
- O que é que há nas suas calças que não há nas minhas?
O diretor arregala os olhos, mas não tem tempo de interromper...
- Bolsos. (Responde o Joãozinho).
Mais uma:
- O que é que entra na frente na mulher e que só pode entrar atrás no homem?
Estupefato com os questionamentos, o diretor prende a respiração...
- A letra "M". (Responde o garoto.)
A professora continua a argüição:
- Onde é que a mulher tem o cabelo mais enroladinho?
- Na África. (Responde Joãozinho de primeira.)
E continua:
- O que é que entra duro e sai mole pingando?
O diretor apavorado. E o Joãozinho responde:
- O macarrão na panela.
E a professora não para:
- O que é que começa com "b", tem "c" no meio, termina com "a" e para ser usada é preciso abrir as pernas? O diretor fica paralisado. E o Joãozinho responde:
- A bicicleta.
E a professora continua:
- Qual o monossílabo tônico que começa com a letra "C" termina com a letra "U" e ora está sujo ora está limpo?
O Diretor começa a suar frio.
- O céu, professora.
- O que é que começa com "C" tem duas letras, um buraco no meio e eu já dei para várias pessoas?
- CD.
Não mais se contendo, o diretor interrompe, respira aliviado e diz para a professora:
- Puta que Pariu!!! Põe esse moleque como diretor, pois eu mesmo errei todas!!!

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Macaquice lingüística

....Cá estou eu, ocupando este espaço que o Professor Juarez me confia. E não deixo por menos! Quero começar gritando contra nosso incrível complexo de inferioridade, verdadeira macaquice, estúpida mania de imitar, ignorantemente, tudo aquilo que os queridos “irmãos do norte” fazem.
....Não basta a verdadeira humilhação a que se submetem os brasileiros nas intermináveis filas do consulado americano, com o intuito de obter o precioso visto para comprar tênis em Miami? Não basta o besteirol lingüístico de gente como Luciano do Valle, que insiste em dizer “arina”, “steidium” e outras tolices, em explícitas demonstrações de colonialismo cultural e de desconhecimento da origem e do significado das palavras? E o incrível Elia Júnior, com o seu “delay”? “Tivemos um pequeno delay na transmissão”, diz o inventor do “É pá e bola!”.
....Um locutor de uma FM anuncia o “Tempra Stail”, burra pronúncia inglesada da palavra italiana “stile”, que significa “estilo”. A Fiat, fábrica italiana, não tem vergonha de sua língua pátria e batiza seus produtos com nomes italianos: “Tempra”, que significa “têmpera”, “Palio”, que significa “estandarte” e é o nome de uma festa típica de Siena e Lucca, “Mille”, que significa “mil” etc. Nós, macacos, não fazemos a mínima questão de pronunciar direito nada que venha de língua estrangeira que não seja o inglês. E mais: encarregamo-nos de inglesar tudo.
....Como se não bastassem todas essas manifestações de americanismo doentio, bobo, sou obrigado agora a agüentar mais uma “novidade”. Foi um querido médico e jornalista de Curitiba, Freitas Neto, um culto e respeitável senhor de 74 anos, que me deu a dica. Perguntou-me se eu já havia notado uma “pérola” que as emissoras brasileiras de televisão adotaram há algum tempo. Trata-se da palavra “vivo”, escrita num canto da tela, para indicar, obviamente, que a transmissão é “ao vivo”. Fui verificar e constatei que o bem-humorado Freitas tinha razão.
....Por que “vivo”? De onde terá vindo a inspiração para tamanha demonstração de criatividade? Claro, da matriz. Como nas emissoras (CNN e companhia bela) aparece “live” (que, ao pé da letra, significa “vivo”), num canto da tela, pronto! Palavra mágica! Se na matriz é uma palavra só, na colônia, na filial, também basta uma palavra. Então o que era “ao vivo” virou simplesmente “vivo”. É melhor colocar “morto”. E terminar com uma inscrição: “Aqui jaz a língua portuguesa, assassinada por basbaques, incultos, presunçosos, vendilhões do templo etc.”
....Existia em São Paulo uma empresa pública conhecida por “CMTC”, sigla que significava “Companhia Municipal de Transportes Coletivos”. A expressão é perfeitamente adequada à estrutura da língua portuguesa: um substantivo, “companhia”, caracterizado pelo adjetivo “municipal” e pela locução adjetiva “de transportes”; por sua vez, o substantivo “transportes”, base da locução adjetiva, é caracterizado pelo adjetivo “coletivos”. Repito que a expressão toda é portuguesíssima. Pois bem, o ex-prefeito de São Paulo resolveu fechar a CMTC, para fundar a “São Paulo Transporte”. Esse nome não é português, é inglês. Em inglês, é possível combinar dessa maneira dois substantivos (London Airport, New York City, Chicago Bulls). A língua portuguesa não combina dois substantivos assim. Em português, seria “Transporte de São Paulo”. E é exatamente aí que mora o perigo. Os lingüistas dizem que uma língua começa a ruir quando sua estrutura começa a ser destruída. Mais uma vez, parabéns aos incultos, basbaques, presunçosos, vendilhões do templo etc.
....Quando a demonstração de ignorância vem do poder público, então, que maravilha! Veja-se o caso da palavra “memorial”. Experimente verificar seu significado em um bom dicionário da língua portuguesa. Em quem você acredita mais? Em José Saramago, monumento vivo da língua portuguesa, ou numa “otoridade” qualquer? José Saramago escreveu a obra-prima Memorial do convento, em que, como o nome diz, relata memórias, fatos memoráveis relativos à construção do Convento de Mafra, encantadora cidade portuguesa. Se você prefere acreditar num de nossos cultos governantes, cuidado! Algum deles, certamente babando diante de algum monumento visto durante uma visita à pátria-mãe (United States of America), voltou à colônia com a palavra certa para batizar monumentos erguidos por aqui. “Memorial”, em inglês, é palavra usada exatamente para isso. “Memorial”, em inglês, significa “monumento comemorativo”. Algum basbaque tupiniquim, deslumbrado com as tranqueiras compradas na Galeria Pajé — desculpem, em Miami —, fez a tradução ao pé da letra. Essa palavra é usada indevidamente no Brasil como sinônimo de monumento (Memorial JK, em Brasília, e Memorial da América Latina, em São Paulo, por exemplo). Dá-lhe colonialismo! Dá-lhe macaquice!
....O que fazer? O buraco é mais embaixo. A solução não é tão simples. A coisa leva muito tempo, ou melhor, levaria muito tempo, se algo já estivesse sendo feito.



Até a próxima. Um forte abraço.

Pasquale Cipro Neto

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Concordância Verbal

Regra básica: o verbo concorda com o sujeito em pessoa e número.

Caso 1 – Com sujeito simples posposto
A posição natural do sujeito é antes do verbo, mas a concordância é obrigatória mesmo quando o sujeito aparece depois do verbo:

“COMPARECERAM à reunião todos os diretores”;
“Ainda FALTAM dois exercícios”;
“Para não ser rebaixado, SÃO NECESSÁRIOS no mínimo 40 pontos”.


Caso 2 – Com sujeito oracional
Quando o sujeito é formado por uma oração (= frase com verbo), a concordância se faz no singular:

“Ainda FALTA resolver dois exercícios”;
“Para não ser rebaixado, É NECESSÁRIO no mínimo chegar a 40 pontos”.

Exercício 1 – Assinale a opção que completa corretamente a lacuna das frases abaixo:
1. _______________ (Aconteceu OU aconteceram) vários acidentes nesta esquina.
2. _______________ (Surgiu OU surgiram), na reunião de ontem, duas soluções para o caso.
3. _______________ (Está faltando OU estão faltando) cinco minutos para acabar o jogo.
4. Para este tipo de conserto, ____________ (basta OU bastam) R$200,00.
5. Na fatura, __________ (consta OU constam) sete produtos.
6. ______________ (Segue anexo OU seguem anexos) os arquivos que você solicitou.
7. ______________ (É necessário OU são necessários) dois novos atacantes.
8. ______________ (É necessário OU são necessários) contratar dois atacantes.
9. ______________ (Basta OU bastam) convocar os acusados.
10. ______________ (Está faltando OU estão faltando) assinar quatro documentos.


Caso 3 – Com sujeito simples anteposto
O verbo concorda obrigatoriamente com o núcleo do sujeito (quando houver a preposição “de”, em geral o núcleo do sujeito será o substantivo ou o pronome que fica antes da preposição):

“O PRESIDENTE das organizações Delta VIAJOU a Brasília”;
“Os ATACANTES do Brasil TREINARAM em separado”;
“NENHUM dos atacantes TREINOU ontem”.


Exercício 2 – Complete as lacunas das frases a seguir com a forma verbal correta:
11. O valor dos apartamentos __________ (subiu OU subiram) 5% no ano passado.
12. O número de erros ______________ (diminuiu OU diminuíram) muito.
13. A quantidade de produtos ______________ (é suficiente OU são suficientes).
14. Um de nós dois _________ (deve OU devemos OU devem) viajar a São Paulo na próxima semana.
15. Um deles _________ (vai OU vão) ter de morar na Inglaterra.
16. Nenhum dos candidatos _____________ (desistiu OU desistiram).
17. Qual de nós ____________ (fará OU faremos) o trabalho?
18. Quem dentre eles ___________ (assinará OU assinarão) o contrato?
19. Um de nós __________ (leu OU lemos) o livro.
20. Muitos de nós ___________ (leram OU lemos) o livro.


http://colunas.g1.com.br/portugues/2008/12/03/minicurso/

Carlos Drummond de Andrade

A hora do cansaço
.
.
As coisas que amamos,
as pessoas que amamos
são eternas até certo ponto.
Duram o infinito variável
no limite de nosso poder
de respirar a eternidade.
.
Pensá-las é pensar que não acabam nunca,
dar-lhes moldura de granito.
De outra matéria se tornam, absoluta,
numa outra (maior) realidade.
.
Começam a esmaecer quando nos cansamos,
e todos nos cansamos, por um ou outro itinerário,
de aspirar a resina do eterno.
Já não pretendemos que sejam imperecíveis.
Restituímos cada ser e coisa à condição precária,
rebaixamos o amor ao estado de utilidade.
.
Do sonho de eterno fica esse gozo acre
na boca ou na mente, sei lá, talvez no ar.

A discussão inteligente sobre a rotina do professor

A Fundação Victor Civita (FVC) ampliou sua parceria com a TV Cultura e, neste ano, produzirá em conjunto com a emissora paulista uma nova série Profissão Professor. Serão 13 episódios, com estréia prevista para o dia 27 de setembro. Os programas misturam ficção com experiências reais. Atrizes representam três professoras e uma coordenadora pedagógica, que comentam trabalhos de verdade feitos por vencedores do Prêmio Victor Civita de 2007. O cenário representa a sala dos professores de uma escola.
A idéia é retratar os diálogos e angústias vividos nos chamados horários extra-classe, momentos previstos em lei quando docentes e coordenadores debatem e avaliam estratégias de ensino, discutem as dificuldades da turma e repensam o planejamento das aulas. “Queremos usar a teledramaturgia para mostrar o cotidiano escolar, as trocas que acontecem na sala dos professores, com as dúvidas freqüentes e soluções apontadas por uma coordenadora experiente e parceira”, explica Regina Scarpa, consultora pedagógica da FVC.
Dois programas focarão especificamente a questão da violência doméstica, com análises sobre como o professor deve se comportar quando desconfia de algum problema com seus alunos. Os 11 demais abordarão os temas tratados nos trabalhos dos Educadores Nota 10 e da Escola do Ano. A proposta é, diante dos questionamentos trazidos pelas professoras, mostrar atividades bem sucedidas montadas pelo país.

A transmissão será semanal, aos sábados pela manhã, das 11h às 11h15, na TV Cultura e nas seguintes afiliadas:

Rede Minas, Belo Horizonte (MG)TVE RS, Porto Alegre (RS)TV ITARARÉ, Campina Grande (PB)TV O POVO, Fortaleza (CE)

domingo, 7 de dezembro de 2008

10 erros observados com maior freqüência

Confira alguns do 10 erros observados com maior freqüência
Erros gramaticais e ortográficos devem, por princípio, ser evitados. Alguns, no entanto, como ocorrem com maior freqüência, merecem atenção redobrada. Veja esta lista com dez dos erros mais comuns do idioma e use esta relação como um roteiro para fugir deles.

1 - "Mal cheiro", "mau-humorado". Mal [com a letra ele] é antônimo de bem, e mau [com a letra u], de bom.
Ex.: mau cheiro (bom cheiro), mal-humorado (bem-humorado). Igualmente: mau humor, mal-intencionado, mau jeito, mal-estar.
Se o Lobo-mau não fosse malvado, seria um lobo bom.
Se ela está sentindo dores indesejáveis pelo corpo, é porque não está bem, está passando mal.


2 - Vai assistir o jogo hoje. Assistir, quando se refere ao verbo “presenciar” exige a preposição a. Neste caso, observa-se a junção da preposição mais artigo, e se o artigo for feminino, tem-se o acento indicador de crase.
Ex.: Vai assistir ao jogo, à missa, à sessão.
Outros verbos com a: A medida não agradou (desagradou) à população. / Eles obedeceram (desobedeceram) aos avisos. / Aspirava ao cargo de diretor. / Pagou ao amigo. / Respondeu à carta. / Sucedeu ao pai. / Visava aos estudantes
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3 - Atraso implicará em punição. Implicar é direto no sentido de acarretar, pressupor.
Ex.: Atraso implicará punição. / Promoção implica responsabilidade.

4 - O peixe tem muito "espinho". Os peixes, por terem a ossatura das vértebras muito diminutas e pontiagudas, costumam-se dizer que têm espinhas, e não espinhos conforme insistem alguns.
Veja outras confusões desse tipo: O "fuzil" (fusível) queimou. / Casa "germinada" (geminada), "ciclo" (círculo) vicioso, "cabeçário" (cabeçalho).

5 - Ele foi um dos que "chegou" antes. A expressão "Um dos que" faz a concordância com o verbo no plural.
Ex.: Ele foi um dos que chegaram antes (dos que chegaram antes, ele foi um). / Era um dos que sempre vibravam com a vitória.

6 - Chegou a duas horas e partirá daqui cinco minutos. Há indica passado e equivale a faz, enquanto a exprime distância ou tempo futuro (não pode ser substituído por faz).
Ex.: Chegou há (faz) duas horas e partirá daqui a (tempo futuro) cinco minutos. / O atirador estava a (distância) pouco menos de 12 metros. / Ele partiu há (faz) pouco menos de dez dias.

7 - A moça estava ali muito tempo. O verbo "haver" concorda com o verbo "estava".
Ex.: A moça estava ali havia (fazia) muito tempo. / Ele doara sangue ao filho havia (fazia) poucos meses. / Estava sem dormir havia (fazia) três meses. (O havia se impõe quando o verbo está no imperfeito e no mais-que-perfeito do indicativo.)

8 - A temperatura chegou a 0 "graus". Zero indica singular sempre.
Ex.: Zero grau, zero-quilômetro, zero hora.

9 - A tese "onde"... Onde só pode ser usado para lugar.
Ex.: A casa onde ele mora. / Veja o jardim onde as crianças brincam. Nos demais casos, use em que: A tese em que ele defende essa idéia. / O livro em que... / A faixa em que ele canta... / Na entrevista em que...

10 - O fato passou "desapercebido". Na verdade, o fato passou despercebido, não foi notado. Desapercebido significa desprevenido.

Oficina de teatro (texto)

NO BOTEQUIM
Freguês — Garçom, por favor. Eu queria um café com leite e uma rosquinha.
Garçom — O senhor vai me desculpar, mas não tem mais rosquinha.
Freguês — Ah? Não tem mais rosquinha?
Garçom — Não senhor.
Freguês — Não faz mal. Então me dá só um cafezinho simples. Isso. Só um cafezinho. (pausa) Com uma rosquinha.
Garçom — Eu acho que eu não me expliquei direito. Eu falei pro senhor que não tem mais rosquinha. Acabou toda a rosquinha.
Freguês — Ah bom. Se é assim, muda tudo. Acabou a rosquinha?
Garçom — Acabou, sim senhor.
Freguês — Então me traz um copinho de leite. Leite tem?
Garçom — Tem, sim senhor.
Freguês — Beleza. Me traz um copo de leite. Com uma rosquinha.
Garçom — Eu disse que não tem mais rosquinha! Torrada tem, rosquinha não tem! Há três anos que não tem mais rosquinha!
Freguês — Calma, o senhor também não precisa ficar nervoso. Não tem, não tem. Eu peço outra coisa. Qualquer coisa. Eu não sou difícil pra comer. Eu tomo o que o senhor quiser. Chocolate, chá, sei lá. Chá o senhor tem?
Garçom — Tenho, sim senhor.
Freguês — Então taí. Traz um chazinho. (pausa) Com uma rosquinha.
Garçom — Eu disse que eu não tenho rosquinha. Faz o seguinte. Vai em outro boteco. Não me enlouquece. Vai em outro boteco!
Freguês — Não, pode deixar. Vamos mudar tudo. O que eu não quero é que o senhor se aborreça. Em vez disso me dá uma coisa que alimente mais. Totalmente diferente. Uma coalhada. Taí. Uma coalhada. Coalhada tem?
Garçom — Tem.
Freguês — Tem mesmo?
Garçom — Tem.
Freguês — Vê lá, hein? Não me vai fazer mudar o pedido de novo à toa.
Garçom — Eu já disse que tem! O senhor vai querer ou não?!
Freguês — Vou querer ou não, o quê?
Garçom — A coalhada!
Freguês — Claro que sim. Acho ótimo. Uma coalhada. (pausa) Mas não se esqueça da rosquinha.
Garçom — O senhor é maluco, é? Não tem rosquinha! Não tem rosquinha!!!
Freguês — Tá bom, tá bom. Não precisa gritar. Traz só a rosquinha, pronto.
Freguês 2 (que está na mesa ao lado) — Escuta aqui. O senhor quer enlouquecer o garçom, é? Há dez minutos que eu estou ouvindo essa sua conversa doida e eu juro que não sei como ele está agüentando!
Freguês 2 (para o garçom) — Olha, não liga pra esse maluco não. Traz logo essa porcaria dessa rosquinha e manda ele embora.
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Revista Veja - Edição 1229 - 8, Abril, 1992
Coluna: Jô Soares

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Eu amo você, Língua Portuguesa

Às vezes sinto-me feliz e expresso minha felicidade ao seu lado, companheira amiga, mistério que estou sempre descobrindo. A felicidade tem corpo e cor e pulsa no meu coração e corre a se encontrar com você, então a felicidade vira palavra e eu sofro um pouco porque não sei qual a melhor palavra para expressar o que sinto... Alegria? Con­tentamento? Entusiasmo?
Certos momentos, você sabe, inunda-me uma tristeza sem fim. Mar cheio de ondas, covas profundas de dor e melancolia, então eu olho ao redor e vejo-me tão só, tão só que nem palavras tenho. Mas até nessa angústia completa sinto a necessidade de que você esteja por perto. É a primeira coisa que procuro: nomear a minha dor.
Em outro momento estou inventivo e encontro mil planos para melhorar o mundo, para fazer a vida dos outros mais feliz, para resolver todos os problemas, para que todos se sintam mais completos e verdadeiros. Nessas horas, também você está em mim e eu mergulho nas suas entranhas e tento levar você, a sua riqueza, até o outro que me escuta. Às vezes é tão difícil!
Faltam exércitos de grandes pensadores, como existem na língua inglesa ou france­sa. Faltam muitos poetas, filósofos, sábios, cientistas pensando em português. Expressar raciocínios mais elaborados em português é um verdadeiro desafio. É preciso ter paciên­cia... Você é um diamante, que vai ganhando brilho na lapidação de sua história. História de amor, que você faz com os que aprenderam a amar o seu idioma nas dificuldades de quem você é e de quem nós somos.
Assim eu amo e amar é dizer que se ama e eu amo em português. Não consigo me imaginar dizendo “I love you” para o ser amado e isso ter o mesmo gosto, a mesma sen­sação boa de amor que é dizer, mesmo com erro gramatical: “Eu te amo, você é o meu amor!” E é isso que digo agora, minha língua mãe, em que aprendi a ser quem sou: Eu te amo, você é o meu amor.

LANDEIRA, José Luís e MATEOS, João Henrique

CONTO DE VERÃO Nº 2: BANDEIRA BRANCA

Luís Fernando Veríssimo


Ele: tirolês. Ela: odalisca. Eram de culturas muito diferentes, não podia dar certo. Mas tinham só quatro anos e se entenderam. No mundo dos quatro anos todos se entendem, de um jeito ou de outro. Em vez de dançarem, pularem e entrarem no cordão, resistiram a todos os apelos desesperados das mães e ficaram sentados no chão, fazendo um montinho de confete, serpentina e poeira, até serem arrastados para casa, sob ameaças de jamais serem levados a outro baile de Carnaval.
Encontraram-se de novo no baile infantil do clube, no ano seguinte. Ele com o mesmo tirolês, agora apertado nos fundilhos, ela de egípcia. Tentaram recomeçar o montinho, mas dessa vez as mães reagiram e os dois foram obrigados a dançar, pular e entrar no cordão, sob ameaça de levarem uns tapas. Passaram o tempo todo de mãos dadas. Só no terceiro Carnaval se falaram.
– Como é teu nome?
– Janice. E o teu?
– Píndaro.
– O quê?!
– Píndaro.
– Que nome!
Ele de legionário romano, ela de índia americana. Só no sétimo baile (pirata, chinesa) desvendaram o mistério de só se encontrarem no Carnaval e nunca se encontrarem no clube, no resto do ano. Ela morava no interior, vinha visitar uma tia no Carnaval, a tia é que era sócia.
– Ah.
Foi o ano em que ele preferiu ficar com a sua turma tentando encher a boca das meninas de confete, e ela ficou na mesa, brigando com a mãe, se recusando a brincar, o queixo enterrado na gola alta do vestido de imperadora. Mas quase no fim do baile, na hora do Bandeira Branca, ele veio e a puxou pelo braço, e os dois foram para o meio do salão, abraçados.
E, quando se despediram, ela o beijou na face, disse – Até o Carnaval que vem – e saiu correndo.
No baile do ano em que fizeram 13 anos, pela primeira vez as fantasias dos dois combinaram. Toureiro e bailarina espanhola. Formavam um casal! Beijaram-se muito, quando as mães não estavam olhando. Até na boca. Na hora da despedida, ele pediu:
– Me dá alguma coisa.
– O quê?
– Qualquer coisa.
– O leque.
O leque da bailarina. Ela diria para a mãe que o tinha perdido no salão.
***
No ano seguinte, ela não apareceu no baile.
Ele ficou o tempo todo à procura, um havaiano desconsolado. Não sabia nem como perguntar por ela. Não conhecia a tal tia. Passara um ano inteiro pensando nela, às vezes tirando o leque do seu esconderijo para cheirá-lo, antegozando o momento de encontrá-la outra vez no baile. E ela não apareceu. Marcelão, o mau elemento da sua turma, tinha levado gim para misturar com o guaraná.
Ele bebeu demais. Teve que ser carregado para casa. Acordou na sua cama sem lençol, que estava sendo lavado. O que acontecera?
– Você vomitou a alma – disse a mãe.
Era exatamente como se sentia. Como alguém que vomitara a alma e nunca a teria de volta. Nunca.
Nem o leque tinha mais o cheiro dela.
Mas, no ano seguinte, ele foi ao baile dos adultos no clube – e lá estava ela! Quinze anos. Uma moça. Peitos, tudo. Uma fantasia indefinida.
– Sei lá. Bávara tropical – disse ela, rindo.
Estava diferente. Não era só o corpo. Menos tímida, o riso mais alto. Contou que faltara no ano anterior porque a avó morrera, logo no Carnaval.
– E aquela bailarina espanhola?
– Nem me fala. E o toureiro?
– Aposentado.
A fantasia dele era de nada. Camisa florida, bermuda, finalmente um brasileiro. Ela estava com um grupo. Primos, amigos dos primos. Todos vagamente bávaros. Quando ela o apresentou ao grupo, alguém disse – Píndaro?! – e todos caíram na risada. Ele viu que ela estava rindo também. Deu uma desculpa e afastou-se. Foi procurar o Marcelão. O Marcelão anunciara que levaria várias garrafas presas nas pernas, escondidas sob as calças da fantasia de sultão. O Marcelão tinha o que ele precisava para encher o buraco deixado pela alma. Quinze anos, pensou ele, e já estou perdendo todas as ilusões da vida, começando pelo Carnaval. Não devo chegar aos 30, pelo menos não inteiro. Passou todo o baile encostado numa coluna adornada, bebendo o guaraná clandestino do Marcelão, vendo ela passar abraçada com uma sucessão de primos e amigos de primos, principalmente um halterofilista, certamente burro, talvez até criminoso, que reduzira sua fantasia a um par de calças curtas de couro.
Pensou em dizer alguma coisa, mas só o que lhe ocorreu dizer foi – pelo menos o meu tirolês era autêntico – e desistiu. Mas, quando a banda começou a tocar Bandeira Branca e ele se dirigiu para a saída, tonto e amargurado, sentiu que alguém o pegava pela mão, virou-se e era ela. Era ela, meu Deus, puxando-o para o salão. Ela enlaçando-o com os dois braços para dançarem assim, ela dizendo – não vale, você cresceu mais do que eu – e encostando a cabeça no seu ombro. Ela encostando a cabeça no seu ombro.
***
Encontraram-se de novo 15 anos depois. Aliás, neste Carnaval. Por acaso, num aeroporto. Ela desembarcando, a caminho do interior, para visitar a mãe. Ele embarcando para encontrar os filhos no Rio. Ela disse – quase não reconheci você sem fantasias. Ele custou a reconhecê-la. Ela estava gorda, nunca a reconheceria, muito menos de bailarina espanhola. A última coisa que ele lhe dissera fora – preciso te dizer uma coisa –, e ela dissera – no Carnaval que vem, no Carnaval que vem – e no Carnaval seguinte ela não aparecera, ela nunca mais aparecera. Explicou que o pai tinha sido transferido para outro estado, sabe como é, Banco do Brasil, e como ela não tinha o endereço dele, como não sabia nem o sobrenome dele e, mesmo, não teria onde tomar nota na fantasia de falsa bávara.
– O que você ia me dizer, no outro Carnaval? – perguntou ela.
– Esqueci – mentiu ele.
Trocaram informações. Os dois casaram, mas ele já se separou. Os filhos dele moram no Rio, com a mãe. Ela, o marido e a filha moram em Curitiba, o marido também é do Banco do Brasil. – E a todas essas ele pensando: digo ou não digo que aquele foi o momento mais feliz da minha vida, Bandeira Branca, a cabeça dela no meu ombro, e que todo o resto da minha vida será apenas o resto da minha vida? E ela pensando: como é mesmo o nome dele? Péricles. Será Péricles? Ele: digo ou não digo que não cheguei mesmo inteiro aos 30, e que ainda tenho o leque? Ela: Petrarco. Pôncio. Ptolomeu.


MORICONI, Ítalo. Os cem melhores contos brasileiros do século.
Rio de Janeiro: Objetiva, 2000, p. 582-5.

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

As reformas educacionais na época de Pombal

Com o primeiro-ministro português, o Marquês de Pombal, iniciou-se uma fase de reformas educacionais. Os jesuítas foram expulsos em 1759. Seus colégios foram fechados e os seminários que se encontravam sob sua influência entraram em crise. Com as reformas, o Estado assumiu diretamente a responsabilidade sobre a instrução escolar, cobrando um imposto, o “subsídio literário”, e introduzindo as aulas régias.
O governo, além disso, movido por uma visão pragmática do conhecimento cientifico, tomou uma série de medidas culturais e educacionais a fim de dinamizar a produção de matérias-primas na colônia em beneficio da metrópole, entre as quais o apoio à constituição de academias cientificas e literárias, e a criação de instituições educacionais e aulas voltadas para estudos práticos e científicos.
Com o intuito de reforçar os elos entre a colônia e a metrópole, a Coroa incentivou a ida de brasileiros para estudar na universidade de Coimbra. (...) Tais iniciativas educacionais e cientificas, no entanto, foram marcadas por seu caráter pragmático e circunstancial. Dessa forma, não levaram a um progresso cientifico expressivo e não alteraram, na prática, nem a tendência de desprestigiar a educação escolar, nem a dependência, em termos de ensino superior, em relação à universidade de Coimbra.
Além disso, as reformas enfrentaram problemas, estabelecendo-se uma grande distância entre as intenções legais e a realidade. O ensino, do nível das primeiras letras ao secundário, passou a ser ministrado sob a forma de aulas avulsas, fragmentando o processo pedagógico. Faltavam professores, manuais e livros sugeridos pelos novos métodos. Os recursos orçamentários foram insuficientes para custear a educação pública, havendo atrasos nos salários dos mestres. A Coroa, em determinadas ocasiões, chegou mesmo a delegar aos pais a responsabilidade pelo pagamento dos mestres. Isso mostra com a educação, tornada pública pela lei, esteve em grande parte privatizada.
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Luiz Carlos Vivalta
O que se fala e o que se lê: língua, instrução e leitura.

História da Literatura

Alguns leitores até se espantam ao constatarem que o estudo da literatura se aproxima e se assemelha aos estudos de história. Pois é, tem tudo a ver, pois na verdade é isso mesmo que estudamos, "história da literatura". Somente dizer que se estuda literatura, é uma verdade questionável, visto que literatura é uma arte e como arte não tem como ser ensinada. A literatura, assim como as demais artes (pintura, escultura, dança, música, arquitetura) é algo particular de cada artista, uma expressão de liberdade... O artista é um ser livre, faz o que quer e como quer. Não existe manual algum que dite as normas a um pintor, por exemplo, sobre como proceder para pintar um quadro. Também para o artista das letras, não existe nada que determine ou estipule parâmetros para execução da arte literária. Portanto, quando se diz "estudo da literatura", na verdade, o que se quer se dizer é "estudo da história da literatura", isto é, o estudo das condicionantes que propiciaram ao artista a elaboração de determinada obra... Desta forma, pode-se dizer que a história da literatura contempla os estudos relativos ao contexto do tempo e do espaço em que tal obra foi criada, ou seja, quem é o artista?, onde vive?, quais os acontecimentos importantes da época? qual as semelhanças e desassemelhanças observadas entre a obra de diferentes artistas? etc. A História da Literatura diante da a obra literária, atribuindo-lhe classificação quanto ao gênero, característica, período histórico, nacionalidade, vida e obra do autor, entre outras especificidades.

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

LADAINHA DO CERVEJEIRO

Sexta-feira, final de tarde: chegai-vos a nós
Boteco do Bate-Forte: abra as portas pra nós
Seo Bate-Forte: recebei a nós
Copo americano: lavai-o pra nós
Mesa e cadeira: limpai-as pra nós
Freezer horizontal: gelai por nós
Garrafa da loirinha: abri pra nós
Colarinho de espuma: fazei-o por nós
Um gole da branquinha: ofertai-o a nós
Costela gordurosa: assai-a pra nós
Salaminho e calabresa: fatiai-os pra nós
Boa cara e gentileza: demonstrai-as a nós
Faca Amolada e Caneta Louca: livrai-os de nós
Mulher e futebol: noticiai-os a nós
Mocinha bonitinha: passai-vos por nós
Violão em seresta: dedilhai-o pra nós
Truco e sinuquinha: apartai-vos de nós
Uma dúzia às dez da noite: cobrai-a de nós
Isso tudo? Tem certeza? Pendurai pra nós
No caminho lá de casa: auxiliai a nós
Na rampa ou na escada: amparai a nós
A chave no buraco: colocai-a por nós
O caminho do banheiro: indicai-o a nós
Urinada fora do vaso: enxaguai-o por nós
Balançada no danado: sacrificai-vos por nós
Na cama bem quentinha: deitai a nós
A cara feia da patroa: desculpai-a, oh! Vós
Se chamar de “homi” à-toa: justificai-nos por nós
Querida, queridona: perdoai a nós
Escaldado de galinha: preparai-o pra nós
Um suco bem gelado: antecipai-o pra nós
Regurgitada na cama: limpai-a por nós
A feijoada de amanhã: cancelai-a por nós
Amigos e parentes: comunicai-os por nós
Se o estado for ardente: satisfazei-vos a sós
Seis da tarde, com pijama: prometemos a vós
Alcoólicos Anônimos: incentivai a nós
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Adaptada do livro Cerveja e uma porção de bobagens: crônicas do boteco Bate Forte. Hélio Consolaro. Academia Araçatubense de Letras, 2004.

www.aal.folhadaregiao.com.br

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

1º de Dezembro – Dia Internacional de Luta contra a Aids

O que é o Dia Mundial de Luta Contra a Aids?
Transformar o 1º de dezembro em Dia Mundial de Luta Contra a Aids foi uma decisão da Assembléia Mundial de Saúde, em outubro de 1987, com apoio da Organização das Nações Unidas – ONU. A data serve para reforçar a solidariedade, a tolerância, a compaixão e a compreensão com as pessoas infectadas pelo HIV/aids. A escolha dessa data seguiu critérios próprios das Nações Unidas. No Brasil, a data passou a ser adotada, a partir de 1988, por uma portaria assinada pelo Ministério da Saúde.
Por que o laço vermelho como símbolo?
O laço vermelho é visto como símbolo de solidariedade e de comprometimento na luta contra a aids. O projeto do laço foi criado, em 1991, pela Visual Aids, grupo de profissionais de arte, de New York, que queriam homenagear amigos e colegas que haviam morrido ou estavam morrendo de aids.
O que é HIV e aids?
A aids é uma doença que se manifesta após a infecção do organismo humano pelo Vírus da Imunodeficiência Humana, mais conhecido como HIV. Esta sigla é proveniente do inglês - Human Immunodeficiency Virus. Também do inglês deriva a sigla AIDS, Acquired Immune Deficiency Syndrome, que em português quer dizer Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. Síndrome Grupo de sinais e sintomas que, uma vez considerados em conjunto, caracterizam uma doença. Imunodeficiência Inabilidade do sistema de defesa do organismo humano para se proteger contra microorganismos invasores, tais como: vírus, bactérias, protozoários, etc. Adquirida Não é congênita como no caso de outras imunodeficiências. A aids não é causada espontaneamente, mas por um fator externo (a infecção pelo HIV). O HIV destrói os linfócitos - células responsáveis pela defesa do nosso organismo -, tornando a pessoa vulnerável a outras infecções e doenças oportunistas, chamadas assim por surgirem nos momentos em que o sistema imunológico do indivíduo está enfraquecido. Há alguns anos, receber o diagnóstico de aids era quase uma sentença de morte. Atualmente, porém, a aids já pode ser considerada uma doença crônica. Isto significa que uma pessoa infectada pelo HIV pode viver com o vírus, por um longo período, sem apresentar nenhum sintoma ou sinal. Isso tem sido possível graças aos avanços tecnológicos e às pesquisas, que propiciam o desenvolvimento de medicamentos cada vez mais eficazes. Deve-se, também, à experiência obtida ao longo dos anos por profissionais de saúde. Todos estes fatores possibilitam aos portadores do vírus ter uma sobrevida cada vez maior e de melhor qualidade.
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Dúvidas Freqüentes

Atualmente, ainda há a distinção entre grupo de risco e grupo de não risco?
Essa distinção não existe mais. No começo da epidemia, pelo fato da aids atingir, principalmente, os homens homossexuais, os usuários de drogas injetáveis e os hemofílicos, eles eram, à época, considerados grupos de risco. Atualmente, fala-se em comportamento de risco e não mais em grupo de risco, pois o vírus passou a se espalhar de forma geral, não mais se concentrando apenas nesses grupos específicos. Por exemplo, o número de heterossexuais infectados por HIV tem aumentado proporcionalmente com a epidemia nos últimos anos, principalmente entre mulheres.
O que se considera um comportamento de risco, que possa vir a ocasionar uma infecção pelo vírus da aids (HIV)?
Relação sexual (homo ou heterossexual) com pessoa infectada, sem o uso de preservativos; compartilhamento de seringas e agulhas, principalmente, no uso de drogas injetáveis; transfusão de sangue contaminado pelo HIV; reutilização de objetos perfuro-cortantes com presença de sangue ou fluidos contaminados pelo HIV.
Qual o tempo de sobrevida de um indivíduo portador do HIV?
Até o começo da década de 90, a aids era considerada uma doença que levava à morte em um prazo relativamente curto. Porém, com o surgimento do coquetel (combinação de medicamentos responsáveis pelo atual tratamento de pacientes HIV positivo) as pessoas infectadas passaram a viver mais. Esse coquetel é capaz de manter a carga viral do sangue baixa, o que diminui os danos causados pelo HIV no organismo e aumenta o tempo de vida da pessoa infectada.O tempo de sobrevida (ou seja, os anos de vida pós-infecção) é indefinido e varia de indivíduo para indivíduo. Por exemplo, algumas pessoas começaram a usar o coquetel em meados dos anos noventa e ainda hoje gozam de boa saúde. Outras apresentam complicações mais cedo e têm reações adversas aos medicamentos. Há, ainda, casos de pessoas que, mesmo com os remédios, têm infecções oportunistas (infecções que se instalam, aproveitando-se de um momento de fragilidade do sistema de defesa do corpo, o sistema imunológico).
Quanto tempo o HIV sobrevive em ambiente externo?
O vírus da aids é bastante sensível ao meio externo. Estima-se que ele possa viver em torno de uma hora fora do organismo humano. Graças a uma variedade de agentes físicos (calor, por exemplo) e químicos (água sanitária, glutaraldeído, álcool, água oxigenada) pode tornar-se inativo rapidamente.

Para quem curte vídeos na internet

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quinta-feira, 27 de novembro de 2008

O português falado em Portugal

Acento
Um dia, no Brasil, o Jô Soares entrou num táxi e o motorista, que era um português, foi logo o reconhecendo. O Jô, brincalhão, perguntou como ele descobrira. E o motorista respondeu: pelo seu acento. E não estava se referindo ao bumbum do Jô, mas sim ao sotaque.

Banheiro
Jamais, em momento algum, diga que quer ir a um banheiro. Dizer isso significa que você quer ir ao encontro do salva-vidas, aquele que fica na praia de camiseta branca com uma cruz vermelha no peito. E, se for mulher, a salva-vidas atende pelo sugestivo nome de banheira.

Bicha
Esta é a bicha mais famosas das diferenças. Todo mundo sabe que bicha é fila em Portugal.

Carcaça
O Pãozinho com que se fazem sanduíches. E que vem na mesa, nas refeições, nos restaurantes. E atenção: jamais recuse o pão nos restaurantes. Mesmo que você não o coma, e eles não vão cobrar, mas deixe o pão lá. Eles acham que, desde que Cristo colocou o pão na mesa, é uma tradição comer o pão ali. Quer irritar o garçom é mandá-lo levar o pão de volta.

Casa de banho
Mesmo que você não tenha chuveiro, mesmo que seja um lavabo, todo banheiro chama-se casa de banho. Deve haver aqui também uma influencia moura, com suas casas de banho. Não esquecer que os romanos também estiveram lá com suas saunas e termas. No Alcântara Café tem uma belíssima casa de banho masculina. Você já sabe, ir ao banheiro significa ir conversar, na praia, com o salva vidas.

Do pé para a mão
É exatamente o nosso de uma hora para outra.

Drogaria
Atenção, pois não é uma farmácia. Vende todo tipo de drogas (não alucinógenas), menos remédios. É uma espécie de armarinho e tem em quase todas as esquinas. Vende material de limpeza, vaso de plantas, capacho, cabide, martelo, comida de passarinho, vassoura etc.

Estendal
Não é aquele escritor francês de O Vermelho e o Negro. É varal mesmo! Acho que, da mesma maneira que Portugal não estava preparado para tanto carro, não estava também para tanta roupa. Assim como nos apartamentos não têm garagem, não tem área de serviço. As roupas ficam todas penduradas para fora. Dão uma certo ar siciliano às ruas, muito bonito.

Fato
Não confundir fato com facto. Facto é o acontecimento, e fato, aquilo que você veste para ir a certos acontecimentos. De facto, fato é o terno.

Gelado
No verão, as crianças não saem das geladeiras. É a primeira palavra que aprendem em Portugal. Sorvete.

Impedido
Nada a ver com futebol, onde impedido é fora-de-jogo. Impedido em Portugal é quando o telefone está ocupado.


PRATA, Mário. Dicionário de Português – “Schifaizfavoire”. 17. ed. São Paulo: Globo, 1997

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

AMISTAD

Costa de Cuba, 1839. Dezenas de escravos negros se libertam das correntes e assumem o comando do navio negreiro La Amistad. Eles sonham retornar para a África, mas desconhecem navegação e se vêem obrigados a confiar em dois tripulantes sobreviventes, que os enganam e fazem com que, após dois meses, sejam capturados por um navio americano, quando desordenadamente navegaram até a costa de Connecticut. Os africanos são inicialmente julgados pelo assassinato da tripulação, mas o caso toma vulto e o presidente americano Martin Van Buren (Nigel Hawthorn), que sonha ser reeleito, tenta a condenação dos escravos, pois agradaria aos estados do sul e também fortaleceria os laços com a Espanha, pois a jovem Rainha Isabella II (Anna Paquin) alega que tanto os escravos quanto o navio são seus e devem ser devolvidos. Mas os abolicionistas vencem, e no entanto o governo apela e a causa chega a Suprema Corte Americana. Este quadro faz o ex-presidente John Quincy Adams (Anthony Hopkins), um abolicionista não-assumido, sair da sua aposentadoria voluntária, para defender os africanos.
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Uma ótima sugestão de filme

O SOLDADO E O POETA

Um olhar, um sorriso, uma promessa
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Tantas coisas lindas que o tempo apagou
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Mesmo sob um acompanhamento incessante
como a dedicação de um soldado
que observa, que protege, que se entrega
incondicionalmente ao seu bem maior:
o amor...
e por ele luta e morre
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Não quero ser apenas mais um soldado.
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Quero ser um poeta!
Estes sim, estão rodeados pelas belezas das coisas
Estes não se reportam às casernas,
são livres como pássaros ao vento.
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Pobres soldados, que lutam e nem sempre
conquistam a felicidade.
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Pobres poetas, que idealizam a felicidade para
contraporem às lutas de seus corações.
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(Juarez Firmino)

terça-feira, 25 de novembro de 2008

A caolha

A caolha era uma mulher magra, alta, macilenta, peito fundo, busto arqueado, braços compridos, delgados, largos nos cotovelos, grossos nos pulsos; mãos grandes, ossudas, estragadas pelo reumatismo e pelo trabalho; unhas grossas, chatas e cinzentas, cabelo crespo, de uma cor indecisa entre o branco sujo e o louro grisalho, desse cabelo cujo contato parece dever ser áspero e espinhento; boca descaída, numa expressão de desprezo, pescoço longo, engelhado, como o pescoço dos urubus, dentes falhos e cariados.
O seu aspecto infundia terror às crianças e repulsão aos adultos; não tanto pela sua altura e extraordinária magreza, mas porque a desgraçada tinha um defeito horrível; haviam lhe extraído o olho esquerdo; a pálpebra descera mirrada, deixando, contudo, junto ao lacrimal, uma fistula continuamente porejante.
Era essa pinta amarela sobre o fundo denegrido da olheira, era essa destilação incessante de pus que a tornava repulsiva aos olhos de toda a gente.
Morava numa casa pequena, paga pelo filho único, operário numa oficina de alfaiate; ela lavava a roupa para os hospitais e dava conta de todo o serviço da casa, inclusive cozinha. O filho, enquanto era pequeno, comia os pobres jantares feitos por ela, às vezes até no mesmo prato; a proporção que ia crescendo, ia-se-lhe a pouco e pouco manifestando na fisionomia a repugnância por essa comida; até que um dia, tendo já um ordenadozinho, declarou à mãe que, por conveniência do negócio, passava a comer fora...
Ela fingiu não perceber a verdade, e resignou-se.
Daquele filho vinha-lhe todo o bem e todo o mal.
Que lhe importava o desprezo dos outros, se o seu filho adorado lhe apagasse com um beijo todas as amarguras da existência?
Um beijo dele era melhor que um dia de sol, era a suprema carícia para o seu triste coração de mãe! Mas... os beijos foram se escasseando também, com o crescimento do Antonico! Em criança ele apertava-a nos bracinhos e enchia-lhe a cara de beijos; depois, passou a beijá-la só na face direita, aquela onde não havia vestígios da doença; agora, limitava-se a beijar-lhe a mão!
Ela compreendia tudo e calava-se.
O filho não sofria menos.
Quando em criança entrou para a escola pública da freguesia, começaram logo os colegas, que o viam ir e vir com a mãe, a chamá-lo — o filho da caolha.
Aquilo exasperava-o; respondia sempre.
Os outros riam-se e chacoteavam-no; ele queixava-se aos mestres, os mestres ralhavam com os discípulos, chegavam mesmo a castigá-los — mas a alcunha pegou, já não era só na escola que o chamavam assim.
Na rua, muitas vezes, ele ouvia de uma ou de outra janela dizerem: o filho da caolha! Lá vai o filho da caolha! Lá vem o filho da caolha!
Eram as irmãs dos colegas, meninas novas, inocentes e que, industriadas pelos irmãos, feriam o coração do pobre Antonico cada vez que o viam passar!
As quitandeiras, onde iam comprar as goiabas ou as bananas para o lunch, aprenderam depressa a denominá-lo como os outros e, muitas vezes, afastando os pequenos que se aglomeravam ao redor delas, diziam, estendendo uma mancheia de araçás, com piedade e simpatia:
— Taí, isso é para o filho da caolha!
O Antonico preferia não receber o presente a ouvi-lo acompanhar de tais palavras; tanto mais que os outros, com inveja, rompiam a gritar, cantando em coro, num estribilho já combinado:
— Filho da caolha, filho da caolha!
O Antonico pediu à mãe que o não fosse buscar à escola; e, muito vermelho, contou-lhe a causa; sempre que o viam aparecer à porta do colégio os companheiros murmuravam injúrias, piscavam os olhos para o Antonico e faziam caretas de náuseas!
A caolha suspirou e nunca mais foi buscar o filho.
Aos onze anos o Antonico pediu para sair da escola: levava a brigar com os condiscípulos, que o intrigavam e malqueriam. Pediu para entrar para uma oficina de marceneiro. Mas na oficina de marceneiro aprenderam depressa a chamá-lo — o filho da caolha, a humilhá-lo, como no colégio.
Além de tudo, o serviço era pesado e ele começou a ter vertigens e desmaios. Arranjou então um lugar de caixeiro de venda; os seus ex-colegas agrupavam-se à porta, insultando-o, e o vendeiro achou prudente mandar o caixeiro embora, tanto que a rapaziada ia-lhe dando cabo do feijão e do arroz expostos à porta nos sacos abertos! Era uma contínua saraivada de cereais sobre o pobre Antonico!
Depois disso passou um tempo em casa, ocioso, magro, amarelo, deitado pelos cantos, dormindo às moscas, sempre zangado e sempre bocejante! Evitava sair de dia e nunca, mas nunca, acompanhava a mãe; esta poupava-o: tinha medo de que o rapaz, num dos desmaios, lhe morresse nos braços, e por isso nem sequer o repreendia! Aos dezesseis anos, vendo-o mais forte, pediu e obteve-lhe, a caolha, um lugar numa oficina de alfaiate. A infeliz mulher contou ao mestre toda a história do filho e suplicou-lhe que não deixasse os aprendizes humilha-lo: que os fizesse terem caridade!
Antonico encontrou na oficina uma certa reserva e silêncio por parte dos companheiros; quando o mestre dizia: Sr. Antonico, ele percebia um sorriso mal oculto no lábios dos oficiais; mas a pouco e pouco essa suspeita, ou esse sorriso, se foi desvanecendo, até que um principiou a sentir-se bem ali.
Decorreram alguns anos e chegou a vez de Antonico se Apaixonar. Até aí, numa ou outra pretensão de namoro que ele tivera, encontrava sempre uma resistência que o desanimava, e que o fazia retroceder sem grandes mágoas. Agora, porém, a coisa era diversa: ele amava! amava como um louco a linda moreninha da esquina fronteira, uma rapariguinha adorável, de olhos negros como veludo e boca fresca como um botão de rosa. O Antonico voltou a ser assíduo em casa e expandia-se mais carinhosamente com a mãe; um dia em que viu os olhos da morena fixarem os seus, entrou como um louco no quarto da caolha e beijou-a mesmo na face esquerda, num transbordamento de esquecida ternura!
Aquele beijo foi para a infeliz uma inundação de júbilo! tornara encontrar o seu querido filho! pôs-se a cantar toda a tarde, e nessa noite, ao adormecer, dizia consigo:
— Sou muito feliz... o meu filho é um anjo!
Entretanto, o Antonico escrevia, num papel fino, a sua declaração de amor à vizinha. No dia seguinte mandou-lhe cedo a carta. A resposta fez-se esperar. Durante muitos dias Antonico perdia-se em amarguradas conjecturas.
Ao princípio pensava:
— “É o pudor”. Depois começou a desconfiar de outra causa; por fim recebeu uma carta em que a bela moreninha confessava consentir em ser sua mulher, se ele se separasse completamente da mãe! Vinham explicações confusas, mal alinhavadas: lembrava a mudança de bairro; ele ali era muito conhecido por filho da caolha, e bem compreendia que ela não se poderia sujeitar a ser alcunhada em breve de — nora da caolha, ou coisa semelhante!
O Antonico chorou! Não podia crer que a sua casta e gentil moreninha tivesse pensamentos tão práticos!
Depois o seu rancor voltou-se para a mãe.
Ela era a causadora de toda a sua desgraça! Aquela mulher perturbara a sua infância, quebrara-lhe todas as carreiras, e agora o seu mais brilhante sonho de futuro sumia-se diante dela! Lamentava-se por ter nascido de mulher tão feia, e resolveu procurar meio de separar-se dela; considerar-se-ia humilhado continuando sob o mesmo teto; havia de protegê-la de longe, vindo de vez em quando vê-la à noite, furtivamente...
Salvava assim a responsabilidade de protetor e, ao mesmo tempo, consagraria à sua amada a felicidade que lhe devia em troca do seu consentimento e amor...
Passou um dia terrível; à noite, voltando para casa, levava o seu projeto e a decisão de o expor à mãe.
A velha, agachada à porta do quintal, lavava umas panelas com um trapo engordurado. O Antonico pensou: “A dizer a verdade eu havia de sujeitar minha mulher a viver em companhia de... uma tal criatura?” Estas últimas palavras foram arrastadas pelo seu espírito com verdadeira dor. A caolha levantou para ele o rosto, e o Antonico, vendo-lhe o pus na face, disse:
— Limpe a cara, mãe...
Ela sumiu a cara no avental; ele continuou:
— Afinal nunca me explicou bem a que é devido esse defeito!
— Foi uma doença, — respondeu sufocadamente a mãe — é melhor não lembrar isso!
— E é sempre a sua resposta: é melhor não lembrar isso! Por quê?
— Porque não vale a pena; nada se remedeia...
— Bem! agora escute: traga-lhe uma novidade: o patrão exige que eu vá dormir na vizinhança da loja... já aluguei um quarto: a senhora fica aqui e eu virei todos os dias a saber da sua saúde ou se tem necessidade de alguma coisa... É por força maior; não temos outro remédio senão sujeitar-nos!...
Ele, magrinho, curvado pelo hábito de costurar sobre os joelhos, delgado e amarelo como todos os rapazes criados à sombra das oficinas, onde o trabalho começa cedo e o serão acaba tarde, tinha lançado naquelas palavras toda a sua energia, e espreitava agora a mãe com um olho desconfiado e medroso.
A caolha levantou-se e, fixando o filho com uma expressão terrível, respondeu com doloroso desdém:
— Embusteiro! o que você tem é vergonha de ser meu filho! Saia! que eu também sinto vergonha de ser mãe de semelhante ingrato!
O rapaz saiu cabisbaixo, humilde, surpreso da atitude que assumira a mãe, até então sempre paciente e cordata; ia com medo, maquinalmente, obedecendo à ordem que tão feroz e imperativamente lhe dera a caolha.
Ela acompanhou-o, fechou com estrondo a porta, e vendo-se só, encostou-se cambaleante à parede do corredor e desabafou em soluços.
O Antonico passou uma tarde e uma noite de angústia.
Na manhã seguinte o seu primeiro desejo foi voltar à casa; mas não teve coragem; via o rosto colérico da mãe, faces contraídas, lábios adelgaçados pelo ódio, narinas dilatadas, o olho direito saliente, a penetrar-lhe até o fundo do coração, o olho esquerdo arrepanhado, murcho — e sujo de pus; via a sua atitude altiva, o seu dedo ossudo, de falanges salientes, apontando-lhe com energia a porta da rua; sentia-lhe ainda o som cavernoso da voz, e o grande fôlego que ela tomara para dizer as verdadeiras e amargas palavras que lhe atirara no rosto; via toda a cena da véspera e não se animava a arrostar com o perigo de outra semelhante.
Providencialmente, lembrou-se da madrinha, única amiga da caolha, mas que, entretanto, raramente a procurava.
Foi pedir-lhe que interviesse, e contou-lhe sinceramente tudo que houvera.
A madrinha escutou-o comovida; depois disse:
— Eu previa isso mesmo, quando aconselhava tua mãe a que te dissesse a verdade inteira; ela não quis, aí está!
— Que verdade, madrinha?
— Hei de dizer-te perto dela; anda, vamos lá!
Encontraram a caolha a tirar umas nódoas do fraque do filho — queria mandar-lhe a roupa limpinha. A infeliz arrependera-se das palavras que dissera e tinha passado toda a noite à janela, esperando que o Antonico voltasse ou passasse apenas... Via o porvir negro e vazio e já se queixava de si! Quando a amiga e o filho entraram, ela ficou imóvel: a surpresa e a alegria amarram-lhe toda a ação.
A madrinha do Antonico começou logo:
— O teu rapaz foi suplicar-me que te viesse pedir perdão pelo que houve aqui ontem e eu aproveito a ocasião para, à tua vista, contar-lhe o que já deverias ter-lhe dito!
— Cala-te! — murmurou com voz apagada a caolha.
— Não me calo! Essa pieguice é que tem te prejudicado! Olha! Rapaz, quem cegou tua mãe foste tu!
O afilhado tornou-se lívido; e ela concluiu:
— Ah, não tiveste culpa! Eras muito pequeno quando, um dia, ao almoço, levantaste na mãozinha um garfo; ela estava distraída, e antes que eu pudesse evitar a catástrofe, tu enterraste-lho pelo olho esquerdo! Ainda tenho no ouvido o grito de dor que ela deu!
O Antonico caiu pesadamente de bruços, com um desmaio; a mãe acercou-se rapidamente dele, murmurando trêmula:
— Pobre filho! Vês? Era por isto que eu não lhe queria dizer nada!



(Júlia Lopes de Almeida)

Poeta angolano

PARA UMA POÉTICA

(Prática) do socialismo

O socialismo deve
resgatar os tambores
e não tentar impor-lhes
ritmos burocráticos.
E dançar – porque não?
O socialismo deve
sorrir todos os dias.
Acender nas noites caladas
uma flor imortal.
O socialismo deve
eliminar a noite
dos calendários.
Ser, além do vermelho
– sua cor natural –
translúcido como
a luz do sol
dos trópicos. O socialismo
deve afastar
as dúvidas sombrias
e espessas
dos olhos dos homens.
Mas do que utopia,
que o socialismo seja
prática. Esperança materializada cada dia
e logo renovada
por novas exigências.
O socialismo não precisa sempre da faca
nos dentes. O socialismo
deve ser generoso,
como este povo
E amplo e luminoso,
como este lugar aberto.

(João Melo)

domingo, 23 de novembro de 2008

O caboclo, o padre e o estudante

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Um estudante e um padre viajavam pelo sertão, tendo como bagageiro um caboclo. Deram-lhe numa casa um pequeno queijo de cabra. Não sabendo dividi-lo, mesmo porque chegaria um pequenino pedaço para cada um, o padre resolveu que todos dormissem e o queijo seria daquele que tivesse, durante a noite, o sonho mais bonito, pensando engabelar todos com os seus recursos oratórios. Todos aceitaram e foram dormir. À noite, o caboclo acordou, foi ao queijo e comeu-o.
Pela manhã, os três sentaram à mesa para tomar café e cada qual teve de contar o seu sonho. O frade disse ter sonhado com a escada de Jacob e descreveu-a brilhantemente. Por ela, ele subia triunfalmente para o céu. O estudante, então, narrou que sonhara já dentro do céu à espera do padre que subia. O caboclo sorriu e falou:
- Eu sonhei que via seu padre subindo a escada e seu doutor lá dentro do céu, rodeado de amigos. Eu ficava na terra e gritava:
- Seu doutor, seu padre, o queijo! Vosmincês esqueceram o queijo.
Então Vosmincês respondiam de longe, do céu:
- Come o queijo, caboclo! Come o queijo, caboclo! Nós estamos no céu, não queremos queijo.
O sonho foi tão forte que eu pensei que era verdade, levantei-me enquanto vosmincês dormiam e comi o queijo...
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CASCUDO, Luís da Câmara. Contos Tradicionais do Brasil.
Belo Horizonte: Itatiaia, São Paulo: Edusp, 1986. p. 213.

Circuito fechado (1)

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xxxxxChinelos, vaso, descarga. Pia, sabonete. Água. Escova, creme dental, água, espuma, creme de barbear, pincel, espuma, gilete, água, cortina, sabonete, água fria, água quente, toalha. Creme para cabelo, pente. Cueca, camisa, abotoaduras, calça, meias, sapatos, telefone, agenda, copo com lápis, caneta, blocos de notas, espátula, pastas, caixa de entrada, de saída, vaso com plantas, quadros, papéis, cigarro, fósforo. Bandeja, xícara pequena. Cigarro e fósforo. Papéis, telefone, relatórios, cartas, notas, vales, cheques, memorandos, bilhetes, telefone, papéis. Relógio. Mesa, cavalete, cinzeiros, cadeiras, esboços de anúncios, fotos, cigarro, fósforo, bloco de papel, caneta, projetos de filmes, xícara, cartaz, lápis, cigarro, fósforo, quadro-negro, giz, papel. Mictório, pia, água. Táxi. Mesa, toalha, cadeiras, copos, pratos, talheres, garrafa, guardanapo. xícara. Maço de cigarros, caixa de fósforos. Escova de dentes, pasta, água. Mesa e poltrona, papéis, telefone, revista, copo de papel, cigarro, fósforo, telefone interno, gravata, paletó. Carteira, níqueis, documentos, caneta, chaves, lenço, relógio, maço de cigarros, caixa de fósforos. Jornal. Mesa, cadeiras, xícara e pires, prato, bule, talheres, guardanapos. Quadros. Pasta, carro. Cigarro, fósforo. Mesa e poltrona, cadeira, cinzeiro, papéis, externo, papéis, prova de anúncio, caneta e papel, relógio, papel, pasta, cigarro, fósforo, papel e caneta, telefone, caneta e papel, telefone, papéis, folheto, xícara, jornal, cigarro, fósforo, papel e caneta. Carro. Maço de cigarros, caixa de fósforos. Paletó, gravata. Poltrona, copo, revista. Quadros. Mesa, cadeiras, pratos, talheres, copos, guardanapos. Xícaras, cigarro e fósforo. Poltrona, livro. Cigarro e fósforo. Televisor, poltrona. Cigarro e fósforo. Abotoaduras, camisa, sapatos, meias, calça, cueca, pijama, espuma, água. Chinelos. Coberta, cama, travesseiro.
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RAMOS, Ricardo. Circuito fechado.
São Paulo: Martins, 1972. p. 21-2.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Mundos Mortos: romance ou ideário? Uma leitura de Otávio de Faria.

O texto se refere à dissertação defendida por mim, em 26 de fevereiro de 2004, no Programa de Pós-Graduação "Mestrado em Letras" da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

RESUMO

O presente trabalho propõe um debate sobre a obra do escritor Otávio de Faria. Os estudos acerca da obra deste autor, até o momento, têm sido restritos a questões delimitadas apenas pelo Modernismo carioca, daí a necessidade de se extrapolar o universo regional e iniciar leituras comparativas com outras obras e autores a partir de um estudo mais aprofundado das técnicas e procedimentos da prosa otaviana. Por sua grande extensão, optamos por analisar apenas o romance Mundos mortos — o primeiro e mais representativo da série de quinze romances intitulada “Tragédia Burguesa” — em que o autor retrata a pequena burguesia carioca dos anos 30. Trata-se de uma literatura exploradora de técnicas narrativas como o fluxo de consciência, o monólogo interior com o discurso direto e indireto livre, amparada pela densidade e pela sondagem psicológica e moral, além da estruturação proporcionada pelo catolicismo existencial que procurava decifrar a condição do homem inserido na sociedade.
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Trinta sugestões para se alcançar a felicidade

1 – Elogie três pessoas por dia
2 – Assista ao nascer do Sol pelo menos uma vez por ano
3 – Tenha um aperto de mão firme
4 – Olhe as pessoas nos olhos
5 – Aprenda a tocar um instrumento musical
6 – Cante no chuveiro
7 – Gaste menos do que ganha
8 – Saiba perdoar a si e aos outros
9 – Aprenda três piadas boas e inofensivas
10 – Beba champanhe sem ter motivos
11 – Trate a todos que você conhece como gostaria de ser tratado
12 – Doe sangue todo ano
13 – Faça novos amigos
14 – Saiba guardar segredos
15 – Devolva tudo o que você pegar emprestado
16 – Não adie uma alegria
17 – Surpreenda quem você ama com presentes inesperados
18 – Aceite sempre uma mão estendida
19 – Reconheça seus erros
20 – Ande de bicicleta
21 – Sorria!! Não custa nada e não tem preço
22 – Lembre do nome das pessoas
23 – Pague suas contas em dia
24 – Pare para sentir o aroma de uma rosa
25 – Não ore para pedir coisas materiais: só sabedoria e coragem
26 – Dê às pessoas uma segunda chance
27 – Não tome nenhuma medida de cabeça quente
28 – Respeite todas as coisas vivas
29 – Dê o melhor de si no seu trabalho
30 – Jamais prive uma pessoa da esperança.
Pode ser que ela só tenha isso.

LIMA BARRETO

A questão do preconceito racial nos textos literários
Concluído em 1922, ano da morte de Lima Barreto, o romance Clara dos Anjos é uma denúncia áspera do preconceito racial e social, vivenciado por uma jovem mulher do subúrbio carioca. O grande historiador e crítico literário Sérgio Buarque de Holanda, já apontava, escrevendo sobre Clara dos Anjos, que é muito difícil “escrever sobre os livros de Lima Barreto sem incorrer um pouco no pecado do biografismo”. Poucos escritores brasileiros foram tão obsessivos na investigação da temática do preconceito quanto Lima Barreto. Mulato, nasceu em 1881, mesmo ano em que o também mulato Machado de Assis introduzia o Realismo na literatura nacional com a publicação de Memórias Póstumas de Brás Cubas e Aluísio Azevedo inaugurava a Naturalismo no Brasil com o romance O Mulato. Não são apenas coincidências. A questão do preconceito contra a mestiçagem, já denunciada no obra de Aluísio Azevedo, será fundamental no pensamento nacional entre a implantação do Naturalismo e a do Modernismo, em 1922, ano da morte de Lima Barreto. Até por razões pessoais, e por viver exatamente nesse período, sempre retratando-o de forma crítica e até ressentida, o autor de Clara dos Anjos seria o escritor que mais sentiria (na pele) o preconceito e o retrataria com tintas mais ácidas na nossa literatura.
"Em Clara dos Anjos relata-se a estória de uma pobre mulata, filha de um carteiro de subúrbio, que apesar das cautelas excessivas da família, é iludida, seduzida e, como tantas outras, desprezada, enfim, por um rapaz de condição social menos humilde do que a sua. É uma estória onde se tenta pintar em cores ásperas o drama de tantas outras raparigas da mesma cor e do mesmo ambiente. O romancista procurou fazer de sua personagem uma figura apagada, de natureza "amorfa e pastosa", como se nela quisesse resumir a fatalidade que persegue tantas criaturas de sua casta: "A priori", diz, "estão condenadas, e tudo e todos parecem condenar os seus esforços e os dos seus para elevar a sua condição moral e social." É claro que os traços singulares, capazes de formar um verdadeiro "caráter" romanesco, dando-lhe relevo próprio e nitidez hão de esbater-se aqui para melhor se ajustarem à regra genérica. E Clara dos Anjos torna-se, assim, menos uma personagem do que um argumento vivo e um elemento para a denúncia."

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

O EMPAREDADO

(...)

Artista! Pode lá isso ser se tu és d'África, tórrida e bárbara, devorada insaciavelmente pelo deserto, tumultuada de matas bravias, arrastada sangrando no lodo das Civilizações despóticas, torvamente amamentada com o leite amargo e venenoso da Angústia! A África arrebatada nos ciclones torvelinhantes das Impiedades supremas, das Blasfêmias absolutas, gemendo, rugindo, bramando no caos feroz, hórrido, das profundas selvas brutas, a sua formidável dilaceração humana! A África laocoôntica, alma de trevas e de chamas, fecundada no Sol e na Noite, errantemente tempestuosa como a alma espiritualizada e tantálica da Rússia, gerada no Degredo e na Neve - pólo branco e pólo negro de Deus!

- Artista?! Loucura! Loucura! Pode lá isso ser se tu vens dessa longínqua região desolada, lá do fundo exótico dessa África sugestiva, gemente, Criação dolorosa e sanguinolenta de Satãs rebelados, dessa flagelada África grotesca e triste, melancólica, gênese assombrosa de gemidos, tetricamente fulminada pelo banzo mortal; dessa África dos Suplícios, sobre cuja cabeça nirvanizada pelo desprezo do mundo Deus arrojou toda a peste letal e tenebrosa das maldições eternas!

A Africa virgem, inviolada no Sentimento, avalanche humana amassada com argilas funestas e secretas para fundir a Epopéia suprema da Dor do Futuro, para fecundar talvez os grandes tercetos tremendos de algum e novo majestoso Dante negro! Dessa África que parece gerada para os divinos cinzéis das colossais e prodigiosas esculturas, para as largas e fantásticas Inspirações convulsas de Doré - inspirações inflamadas, soberbas, choradas, soluçadas,bebidas nos Infernos e nos Céus profundos do Sentimento humano. Dessa África cheia de solidões maravilhosas, de virgindades animais instintivas, de curiosos fenômenos de esquisita Originalidade, de espasmos de Desespero, gigantescamente medonha, absurdamente ululante - pesadelo de sombras macabras - visão valpurgiana de terríveis e convulsos soluços noturnos circulando na Terra e formando, com as seculares, despedaçadas agonias da sua alma renegada, uma auréola sinistra, de lágrimas e sangue, toda em torno da Terra...
Cruz e Souza
ln: Obras. São Paulo, Edições Cultura, 1943.

História da Língua Portuguesa

O surgimento da Língua Portuguesa está profunda e inseparavelmente ligado ao processo de constituição da Nação Portuguesa.
Na região central da atual Itália, o Lácio, vivia um povo que falava latim. Nessa região, posteriormente foi fundada a cidade de Roma. Esse povo foi crescendo e anexando novas terras a seu domínio. Os romanos chegaram a possuir um grande império, o Império Romano. A cada conquista, impunham aos vencidos seus hábitos, suas instituições, os padrões de vida e a língua.
Existiam duas modalidades do latim: o latim vulgar (sermo vulgaris, rusticus, plebeius) e o latim clássico (sermo litterarius, eruditus, urbanus). O latim vulgar era somente falado. Era a língua do cotidiano usada pelo povo analfabeto da região central da atual Itália e das províncias: soldados, marinheiros, artífices, agricultores, barbeiros, escravos, etc. Era a língua coloquial, viva, sujeita a alterações freqüentes. Apresentava diversas variações. O latim clássico era a língua falada e escrita, apurada, artificial, rígida, era o instrumento literário usado pelos grandes poetas, prosadores, filósofos, retóricos... A modalidade do latim imposta aos povos vencidos era a vulgar. Os povos vencidos eram diversos e falavam línguas diferenciadas, por isso em cada região o latim vulgar sofreu alterações distintas o que resultou no surgimento dos diferentes romanços e posteriormente nas diferentes línguas neolatinas.
No século III a.C., os romanos invadiram a região da península ibérica, iniciou-se assim o longo processo de romanização da península. A dominação não era apenas territorial, mas também cultural. No decorrer dos séculos, os romanos abriram estradas ligando a colônia à metrópole, fundaram escolas, organizaram o comércio, levaram o cristianismo aos nativos... A ligação com a metrópole sustentava a unidade da língua evitando a expansão das tendências dialetais. Ao latim foram anexadas palavras e expressões das línguas dos nativos.
No século V da era cristã, a península sofreu invasão de povos bárbaros germânicos (vândalos, suevos e visigodos). Como possuíam cultura pouco desenvolvida, os novos conquistadores aceitaram a cultura e língua peninsular. Influenciaram a língua local acrescentando a ela novos vocábulos e favorecendo sua dialetação já que cada povo bárbaro falava o latim de uma forma diferente.
Com a queda do Império Romano, as escolas foram fechadas e a nobreza desbancada, não havia mais os elementos unificadores da língua. O latim ficou livre para modificar-se.
As invasões não pararam por aí, no século VIII a península foi tomada pelos árabes. O domínio mouro foi mais intenso no sul da península. Formou-se então a cultura moçárabe, que serviu por longo tempo de intermediária entre o mundo cristão e o mundo muçulmano. Apesar de possuírem uma cultura muito desenvolvida, esta era muito diferente da cultura local o que gerou resistência por parte do povo. Sua religião, língua e hábitos eram completamente diferentes. O árabe foi falado ao mesmo tempo que o latim (romanço). As influências lingüísticas árabes se limitam ao léxico no qual os empréstimos são geralmente reconhecíveis pela sílaba inicial al- correspondente ao artigo árabe: alface, álcool, Alcorão, álgebra, alfândega... Outros: bairro, berinjela, café, califa, garrafa, quintal, xarope...
Embora bárbaros e árabes tenham permanecido muito tempo na península, a influência que exerceram na língua foi pequena, ficou restrita ao léxico, pois o processo de romanização foi muito intenso.
Os cristãos, principalmente do norte, nunca aceitaram o domínio muçulmano. Organizaram um movimento de expulsão dos árabes (a Reconquista). A guerra travada foi chamada de "santa" ou "cruzada". Isso ocorreu por volta do século XI. No século XV os árabes estavam completamente expulsos da península.
Durante a Guerra Santa, vários nobres lutaram para ajudar D. Afonso VI, rei de Leão e Castela. Um deles, D. Henrique, conde de Borgonha, destacou-se pelos serviços prestados à coroa e por recompensa recebeu a mão de D. Tareja, filha do rei. Como dote recebeu o Condado Portucalense. Continuou lutando contra os árabes e anexando novos territórios ao seu condado que foi tomando o contorno do que hoje é Portugal.
D. Afonso Henriques, filho do casal, funda a Nação Portuguesa que fica independente em 1143. A língua falada nessa parte ocidental da Península era o galego-português que com o tempo foi diferenciando-se: no sul, português, e no norte, galego, que foi sofrendo mais influência do castelhano pelo qual foi anexado. Em 1290, o rei D. Diniz funda a Escola de Direitos Gerais e obriga em decreto o uso oficial da Língua Portuguesa.