sábado, 15 de abril de 2017
Dialogar e conviver
DIÁLOGO: A COMPETÊNCIA DO CONVIVER
Humberto
Mariotti
INTRODUÇÃO. O diálogo é
uma atividade de conversação cuja principal finalidade é ampliar a comunicação
entre as pessoas e facilitar a produção de ideias novas e significados
compartilhados. Com essa finalidade, ele vem sendo cada vez mais utilizado em
empresas (ou qualquer outro grupo, organização e instituição) em todo o mundo.
A IMPORTÂNCIA DO OUTRO. As pessoas
são dignas de respeito não por causa de suas posses materiais, ou quaisquer
outros privilégios. Sua legitimidade vem do simples fato de que elas existem, de
que são seres humanos como nós próprios. Este deve ser o ponto de partida de
todos os relacionamentos verdadeiramente significativos. Em certas tribos
africanas, existe uma tradição zulu que se baseia nesta afirmação: Uma pessoa
se torna uma pessoa por causa das outras.
DINÂMICA DA
CONVERSAÇÃO.
O diálogo é uma forma de fazer circular ideias e significados. Busca os
seguintes objetivos: a) melhorar a comunicação entre as pessoas; b) observar o
processo do pensamento;
c)
criar redes de conversação; d) produzir e compartilhar significados.
Para
isso, é preciso passar por um aprendizado, que se compõe de dois passos
principais: a) diminuir a quantidade de hábitos mentais que dificultam nossa
capacidade de ouvir; b) buscar alternativas para esses hábitos.
UTILIDADES DO DIÁLOGO. Destas
observações, pode-se deduzir a principal utilidade do método: adotar uma
postura que permita perceber e pensar as mesmas questões de modo diferente. O
resultado pode ser o aparecimento de ideias e soluções novas.
O
questionamento básico do diálogo é simples: o que temos como certo e fora de
dúvida nem sempre é o único modo de perceber o mundo. A pergunta-chave a ser
feita é: “E se suspendermos ao menos temporariamente os nossos modos habituais
de pensar, nossas “certezas”, e conversarmos livremente para ver o que
acontece?” Trata-se, assim, de mudar o modo de olhar, trocar de posição,
observar a partir de outros ângulos, pensar os mesmos problemas de modo
diferente.
Conclui-se,
então, que o diálogo se aplica a qualquer situação em que seja necessário
produzir ideias novas e aprender em grupo. Ele é útil em todas as áreas e
situações em que é preciso modificar nosso modo habitual de perceber o mundo.
Por isso, em organizações de vários países do mundo, o método vem sendo utilizado
nesse sentido.
No
diálogo, o modelo habitual “eu falo, você responde” é substituído pela
alternativa “eu falo, você também fala; falamos juntos”. As ideias novas surgem
por meio da cooperação, não pelo confronto. Não existem o enfrentamento ou a
competição. O que há são interações e ligações. A expressão gráfica da
discussão/debate poderia ser esta: ®
¬. Já para o
diálogo, ela seria uma circularidade:
DIFERENÇAS ENTRE O DIÁLOGO E A
DISCUSSÃO.
A finalidade do diálogo é observar, participar e aprender pela compreensão. O
objetivo da discussão é participar e intervir para aprender pela explicação.
Por isso, no diálogo a postura observadora é o princípio, o meio e o fim. Mas é
indispensável ter em mente que essa observação é sempre participante: observo, mas
ao mesmo tempo me observo observando; faço parte daquilo que observo. O quadro
abaixo resume as principais diferenças entre o diálogo e a discussão/debate:
DIÁLOGO
Visa
abrir questões
Visa
mostrar
Visa
estabelecer relações
Visa
compartilhar ideia
Visa
questionar e aprender
Visa
compreender
Vê
a interação partes/todo
Faz
surgir ideias novas
Busca
a diversidade de ideias
DISCUSSÃO /
DEBATE
Visa
fechar questões
Visa
convencer
Visa
demarcar posições
Visa
defender ideias
Visa
persuadir e ensinar
Visa
explicar
Visa
às partes em separado
Descarta
as ideias vencidas
Busca
acordos
Vimos
que as posturas básicas do diálogo são relativamente poucas. Lembremos agora
que elas podem ser resumidas nos seguintes itens:
a) Prestar
atenção aos fenômenos quando e como eles se mostram;
b)
Descrevê-los sem tentar explicá-los;
c) Respeitar
as diferenças;
d) Não se
deixar influenciar por pressupostos (convicções prévias);
e) Colocar
todos os fenômenos observados em pé de igualdade;
f) Não
delimitar prematuramente o campo de observação;
g) Ver-se
como participante, não como observador.
A SUSPENSÃO
DE PRESSUPOSTOS.
Pressupostos são as nossas crenças, nossas teorias sobre como o mundo deve ser,
nossas “certezas” inabaláveis. Aqui se incluem também os nossos preconceitos.
São hábitos de pensamento a que nos apegamos, de tal modo que eles acabam se
transformando numa segunda natureza. O conjunto de nossos pressupostos forma
aquilo que se denomina de “atitude natural” ou “atitude habitual”. É por isso
que eles são tão difíceis de suspender.
O
filósofo francês Michel de Montaigne já falava sobre isso, quando se referia à
“suspensão do juízo”. Ele observava que suspender não quer dizer eliminar
definitivamente: significa apenas não julgar por algum tempo até que se tenha
uma percepção melhor da pessoa, conceito ou situação. Ou seja: deixar para fazer
os julgamentos um pouco mais tarde, quando for o caso. Enfim, manter a mente
sempre aberta.
OUTROS PONTOS
IMPORTANTES.
Os seguintes pontos são da maior importância para o diálogo como meio de busca
de ideias novas e, portanto, de conhecimento e aprendizagem. Por isso, precisam
ser relembrados:
- O principal
obstáculo ao diálogo é o fato de que as pessoas quase sempre definem o seu
comportamento a partir de ideias firmemente consolidadas, que acabam se
constituindo no principal bloqueio à percepção e ao aprendizado. É o que
podemos chamar de atitude habitual.
- O
aprendizado eficaz depende do modo como aprendemos a questionar essas ideias
prévias. Como resultado, poderemos chegar à abertura mental necessária à
diminuição da resistência à mudança.
- A atitude
habitual pode facilmente transformar-se em posição defensiva. É ela que faz com
que a maioria de nós assuma uma postura resistente, sempre que colocados diante
de ideias novas.
- Para
diminuir essa resistência, como já vimos, é preciso aprender a suspender tal
postura. A suspensão nos leva a uma visão de mundo mais abrangente.
- Esta, por
sua vez, mostra que o conhecimento não é apenas objetivo nem somente subjetivo:
é o resultado da interação entre o observador e o observado. Por isso, lidar com
ele implica que as pessoas aprendam a lidar também com sua subjetividade, isto
é, com o modo como veem o mundo e como essa visão influencia seus
comportamentos.
Se
aprendermos a suspender a atitude habitual, serão removidas — pelo menos em
parte — as defesas que entravam o aprendizado. Ao agir defensivamente,
imaginamos que estamos nos protegendo, quando na verdade perdemos eficácia de
percepção e estreitamos a nossa compreensão.
Humberto Mariotti. Médico,
psicoterapeuta e escritor. Pesquisador independente em teoria da complexidade e
suas aplicações. Criador da disciplina Gestão da Complexidade para MBAs no
Brasil. Sócio diretor do M&Z Complexity Thinking – Centro de Estudos e
Aplicações da Teoria da Complexidade.
E-mail: humberto.mariotti1@gmail.com
www.humbertomariotti.com.br
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