"Olhai para os lírios do campo, como eles crescem; não trabalham, nem fiam. E eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles".

domingo, 2 de março de 2014

Um caso de concordância nominal

Um substantivo com dois artigos

Observe o seguinte exemplo:
Será que tais ocorrências se justificam no âmbito de competência dos recursos especial e extraordinário...?

Trata-se de mais um caso, bastante especial, de concordância nominal: temos aqui um substantivo [recurso] e dois adjetivos [especial e extraordinário]. Isso em si não é nada excepcional, pois a toda hora falamos, por exemplo:

·       jantar fino e gostoso (singular)
·       pessoa amável e correta (singular)
·       pessoas amáveis e corretas (plural)
·       resultados negativos e positivos (plural).

A diferença, no caso do exemplo inicial, é que o substantivo está no plural e os dois adjetivos no singular. Por que é que não se diz “recursos especiais e extraordinários?” Porque desse modo se passaria a ideia de que todos os recursos (em discussão naquele momento) seriam especiais e extraordinários, quando o que se quer transmitir é que há dois tipos de recurso: um especial e um extraordinário.
Pelas regras de concordância nominal, quando se tem um substantivo com mais de um adjetivo, tanto se é possível deixar os adjetivos no singular quanto levá-los para o plural. Não é uma questão de certo ou errado dizer “os setores direitos e esquerdos” ou “os setores direito e esquerdo”, por exemplo. Ambas as formas são gramaticalmente válidas. Mas quando se quer deixar claro, sem sombra de dúvida, que se está falando de duas coisas distintas (ou seja, a soma de um singular mais um singular) usa-se a fórmula substantivo no plural e adjetivos no singular, ou até mesmo um adjetivo no singular e um no plural, quando for o caso, como abaixo se exemplifica:

Dê os valores absoluto e relativo dos algarismos.
O convênio será firmado com os governos federal e estaduais.
As zonas Leste e Oeste foram as mais afetadas em nossa cidade.
A decisão que puniu o servidor deverá ser mantida graças à autonomia das instâncias penal e administrativa.
Encontram-se fissuras nos lados direito e esquerdo do edifício.
As cláusulas resolutivas expressa e tácita operam de pleno direito.
Os filhos da embaixatriz estudaram as línguas francesa, inglesa e alemã.

Outras possibilidades:
Na ocorrência de um substantivo e mais de um adjetivo, também se pode fazer a concordância de duas outras maneiras:
I – Substantivo no singular e repetição do artigo:

Os falsos piratas derrotaram a esquadra brasileira e a argentina.
o valor absoluto e o relativo dos algarismos.
Eles estudaram a língua francesa, a inglesa e a alemã.
II – Substantivo e adjetivos no singular:

Todos os conflitos devem ser resolvidos na esfera municipal e estadual.
O cunho religioso e político dado ao seu pronunciamento desagradou a muitos.
Assuntos envolvendo corrupção seriam tratados no âmbito federal e estadual, assegurou o senador.
Queriam informação sobre a sua experiência acadêmica e profissional.

Não há necessidade de dizer “os cunhos religioso e político” ou “nos ambitos federal e estadual”.  O substantivo no singular neste caso soa melhor. Contudo, deve-se utilizar o plural sempre que possa haver ambiguidade ou margem a dúvidas e equívocos. Se se dissesse, por exemplo, “derrotaram a esquadra brasileira e argentina”, certamente se poderia pensar que se falava de uma só esquadra, formada tanto por brasileiros como por argentinos. Não se tratando de futebol, é até possível...

Fonte:

(Adaptado do livro) PIACENTINI, Maria Tereza de Queiroz. Não tropece na língua: lições e curiosidades do português brasileiro. Curitiba: Bonijuris, 2012.
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