segunda-feira, 29 de dezembro de 2014
A educação, segundo Rubem Alves
Educar
Educar
é mostrar a vida a quem ainda não a viu. O educador diz: Veja! – e, ao falar,
aponta. O aluno olha na direção apontada e vê o que nunca viu. Seu mundo se
expande. Ele fica mais rico interiormente... E, ficando mais rico
interiormente, ele pode sentir mais alegria e dar mais alegria – que é a razão
pela qual vivemos.”
Já
li muitos livros sobre psicologia da educação, sociologia da educação,
filosofia da educação – mas, por mais que me esforce, não consigo me lembrar de
qualquer referência à educação do olhar ou à importância do olhar na educação,
em qualquer deles.
A
primeira tarefa da educação é ensinar a ver... É através dos olhos que as
crianças tomam contato com a beleza e o fascínio do mundo... Os olhos têm de
ser educados para que nossa alegria aumente.
A
educação se divide em duas partes: educação das habilidades e educação das
sensibilidades... Sem a educação das sensibilidades, todas as habilidades são
tolas e sem sentido. Sem a educação das sensibilidades, todas as habilidades
são tolas e sem sentido. Os conhecimentos nos dão meios para viver. A sabedoria
nos dá razões para viver.
Quero
ensinar as crianças. Elas ainda têm olhos encantados. Seus olhos são dotados
daquela qualidade que, para os gregos, era o início do pensamento: a capacidade
de se assombrar diante do banal.
Para
as crianças, tudo é espantoso: um ovo, uma minhoca, uma concha de caramujo, o
voo dos urubus, os pulos dos gafanhotos, uma pipa no céu, um pião na terra.
Coisas que os eruditos não veem.
Na
escola eu aprendi complicadas classificações botânicas, taxonomias, nomes
latinos – mas esqueci. Mas nenhum professor jamais chamou a minha atenção para
a beleza de uma árvore, ou para o curioso das simetrias das folhas.
Parece
que, naquele tempo, as escolas estavam mais preocupadas em fazer com que os
alunos decorassem palavras que com a realidade para a qual elas apontam. As
palavras só têm sentido se nos ajudam a ver o mundo melhor. Aprendemos palavras
para melhorar os olhos.
Há
muitas pessoas de visão perfeita que nada veem. O ato de ver não é coisa
natural. Precisa ser aprendido. Quando a gente abre os olhos, abrem-se as
janelas do corpo, e o mundo aparece refletido dentro da gente.
São
as crianças que, sem falar, nos ensinam as razões para viver. Elas não têm saberes
a transmitir. No entanto, elas sabem o essencial da vida. Quem não muda sua
maneira adulta de ver e sentir e não se torna como criança jamais será sábio.
Rubem Alves
sábado, 20 de dezembro de 2014
A linguagem nos concursos públicos
Do carnaval
no samba do concurso doido
Ao encerrar um ano
bastante difícil e considerando que não tarda a chegada do carnaval, consideramos
oportuno abordar um aspecto de vestibulares e concursos para preenchimento de
cargos públicos. Trata-se da prova de português, também uma folia, mas sem
confetes nem serpentinas. Ao passar os olhos sobre os testes de alguns
concursos e “simulados”, concluímos que ainda há pouco a comemorar, pois alguns
deles põem o candidato contra a parede com frases tão fora da realidade quanto
o título desta coluna.
É louvável que a primeira eliminatória dos concursos públicos inclua
questões de português. Seu mérito é justamente este: levar o pessoal a “correr
atrás do prejuízo”. E haja apostilas e matrículas em cursos preparatórios!
Alguns concursos partem direto para a redação, ótimo (aí o problema
pode ser a correção delas, mas nada é perfeito...). Outros começam com provas
objetivas, que nem sempre avaliam o conhecimento do candidato; isso depende
muito da maneira como se fazem as questões e que tipo de questão é feita. Pode
se beneficiar mais aquele que conhece os macetes de marcar cruzinhas, eliminar
isso e aquilo, fazer somas, do que o candidato que redige bem, tem bom
vocabulário, mas desconhece a “psicologia” da prova objetiva ou a tendência
(para não dizer o humor) de quem a elaborou.
Espera-se de um procurador ou juiz que conheça a língua nativa de modo
a redigir com coerência, clareza e correção seus pareceres, sentenças,
petições, acórdãos. E é importantíssimo que ele saiba consultar dicionários e
livros para solucionar dúvidas. Mas na hora do “vamos ver”, esse pobre advogado
tem que saber, sob pena de reprovação:
—que o plural de puxa-puxa,
pele-vermelha e puro-sangue é puxa(s)-puxas, peles-vermelhas e puros-sangues;
—que são todas frases “erradas”:
Estados Unidos atacam Afeganistão. Fiquem alertas! João namora com Maria. Não
me simpatizei com ela. Aqui se come, se bebe e se é feliz. Sua atitude
implicará em demissão (1). Deu nove horas no relógio da praça (2). Esqueci de
seu nome;
—que na língua nativa as frases
boas (“assinale a frase correta”) são escritas assim: Fi-las com dedicação de
um monge. Nunca me esqueceram seus olhares marotos (3). Meus projetos, nunca
lhos mostrarei. A elas, não lho entregarei (4). O senador favorável à nossa
causa assiste em Brasília. Entrada é proibido (5). Dá-lo-ia, mandá-la-á...
Comentários:
(1) Temos que parar de ser
implicantes com “implicar em”; felizmente bons vestibulares já não estão
insistindo na regência deste verbo.
(2) Quanta história! Já em 1654,
D. Francisco Manuel de Melo escreveu em “Relógios Falantes”: “Não dera ainda
nove horas, que é a taxa de todo cativeiro do matrimônio”.
(3) Que fase marota: os olhares
não me esqueceram ou eu é que não esqueço tais olhares? Aqui a confusão ocorre
pela correlação com, por exemplo, o filme “Esqueceram de mim”, que deveria se
chamar “Esqueceram-se de mim”. Ora, se Érico Veríssimo, Mário de Andrade, Jorge
Amado, José Lins do Rego e Clarice Lispector usaram a expressão “esquecer de”
(sem o pronome oblíquo), por que nós, simples mortais, não temos esse direito?
(4) Afinal, o concurso é para
trabalhar no Brasil ou em Portugal? Pois lá é que se usam os pronomes mo, ma,
lho, lha...
(5) Qualquer pessoa normal que
quiser afixar placa de interdição saberá escrever: proibido entrar ou entrada
proibida ou é proibida a entrada ou até mesmo Proibido entrada, mas nunca usará
a opção sugerida no teste.
Gostamos de gramática, prezamos sua utilidade e defendemos seu ensino.
Porém há um evidente exagero nisso tudo. Não se pode ficar cobrando regras
quando são inócuas ou polêmicas. Essa coisinha de exceção e de “pegadinha” só
faz afastar as pessoas do estudo de português, criando nelas ojeriza ao idioma.
Até pode ser interessante saber que “informar e inflamável apresentam
prefixos de mesmo significado” (in, “para dentro”) e que “amarelar,
infelizmente e apedrejar não são formadas pelo mesmo processo”, pois na 1ª
derivação sufixal, na 2ª derivação prefixal e sufixal e na 3ª parassíntese, mas
se o candidato não tiver memória para decorar tudo isso, danou-se!
Fonte:
(Adaptado do livro)
PIACENTINI, Maria Tereza de Queiroz. Não tropece na língua: lições e
curiosidades do português brasileiro. Curitiba: Bonijuris, 2012.
sexta-feira, 12 de dezembro de 2014
PERFUME EXÓTICO
Quando, cerrando os olhos, numa noite ardente,
Respiro a fundo o odor dos teus seios fogosos,
Vejo abrirem-se ao longe litorais radiosos
Tingidos por um sol monótono e dolente.
Respiro a fundo o odor dos teus seios fogosos,
Vejo abrirem-se ao longe litorais radiosos
Tingidos por um sol monótono e dolente.
Uma ilha preguiçosa que nos traz à mente
Estranhas árvores e frutos saborosos;
Homens de corpos nus, esguios, vigorosos,
Mulheres cujo olhar faísca à nossa frente.
Guiado por teu perfume a tais paisagens belas,
Vejo um porto a ondular de mastros e de velas
Talvez exaustos de afrontar os vagalhões,
Enquanto o verde aroma dos tamarineiros,
Que à beira-mar circula e inunda-me os pulmões,
Confunde-se em minha alma à voz dos marinheiros.
XXIII poema de "As flores do mal"
Charles Baudelaire
Charles Baudelaire
Charles-Pierre Baudelaire foi um poeta boêmio ou dândi ou flâneur e teórico da arte francesa. É considerado um dos precursores do Simbolismo e reconhecido internacionalmente como o fundador da tradição...
.
.
domingo, 7 de dezembro de 2014
Trava-línguas divertidos
TRAVA-LÍNGUAS
A vaca malhada foi molhada por outra vaca molhada e malhada
A vida é uma sucessiva sucessão de sucessões que se sucedem sucessivamente, sem suceder o sucesso...
Alô Tatu! Tu tá ai? Não tando tu, mas tua mulher tando é o mesmo que tu tá.
O tá e o tu tiraram férias do tatu. O tatu sem o tá e o tu, não tinha nada pra ser tatu.
Atrás da porta torta tem uma porca morta.
Trinta e três pratos de trigo para três tigres tristes.
A abelha bisbilhoteira bisbilhotava bolinhas brilhantes. Brincando e bisbilhotando, brilhou mais que bolinhas brilhantes.
O canguru corria cantando a canção. O canguru caçula caçoava e cantarolava a mesma canção.
O grilo gargalhava do grilo gripado. Gracejando, o grilo gripado grunhia um grito engraçado.
A vaca malhada foi molhada por outra vaca molhada e malhada
A vida é uma sucessiva sucessão de sucessões que se sucedem sucessivamente, sem suceder o sucesso...
Alô Tatu! Tu tá ai? Não tando tu, mas tua mulher tando é o mesmo que tu tá.
O tá e o tu tiraram férias do tatu. O tatu sem o tá e o tu, não tinha nada pra ser tatu.
Atrás da porta torta tem uma porca morta.
Trinta e três pratos de trigo para três tigres tristes.
A abelha bisbilhoteira bisbilhotava bolinhas brilhantes. Brincando e bisbilhotando, brilhou mais que bolinhas brilhantes.
O canguru corria cantando a canção. O canguru caçula caçoava e cantarolava a mesma canção.
O grilo gargalhava do grilo gripado. Gracejando, o grilo gripado grunhia um grito engraçado.
Assinar:
Postagens (Atom)