"Olhai para os lírios do campo, como eles crescem; não trabalham, nem fiam. E eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles".

sábado, 12 de janeiro de 2013

Contrabaixo - poesias

Boias-frias
DAMAZO, Tito. In.- Contrabaixo-poesias

 

Vão engaiolados
em caminhões
quase como gado. 

Ainda impera a madrugada
quando saem
de casa para a cana
para a laranja
para a soja,
para qualquer corte,
panha. 

Levam consigo
a insulsa boia
magra;
e a raiva crônica
que mais os alimenta
e resguarda. 

A cana acende a ira do seu algoz,
acende o seu senhor.
A cana estende-se em vasto deserto
de pura energia em processo. 

O canavial é vibrátil.
Sua cantiga,
quanto seu aroma sensualizam
quem o visita. 

A cana é paisagem.
A cana é trabalho.
A cana é vassalagem.
A cana é bagaço.
A cana é vantagem.
A cana é embaraço. 

A cana embarga, embriaga,
engrandece, engorda,
emagrece. 

A cana é a monocultura
mais antiga do Brasil.
Chegou com os colonizadores.
Engendrou o coronel de engenho,
passando pelo de usina
e consolidando-se com o de destilaria. 

O traçado de sua história
vai do burro de carga e da moenda
à mão mecânica que hoje a recolhe
mas cabe ao homem
seu asseio e corte.
O sabor da cana não dissipa
os dissabores da cana.
Mesmo sendo a cana outra.
A cana é a porção mais verde
da bandeira brasileira.

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