"Olhai para os lírios do campo, como eles crescem; não trabalham, nem fiam. E eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles".

sábado, 28 de novembro de 2015

Gradação do advérbio

Embora os advérbios sejam uma classe invariável de palavras, muitos deles, principalmente os de modo, podem apresentar flexão gradual, sendo empregados no comparativo e no superlativo, a exemplo do que ocorre com os adjetivos:

1. Grau comparativo
O comparativo pode ser de:

a) igualdade
João mora tão longe quanto (como) Antônio.
Hoje escureceu tão cedo quanto (como) ontem.

b) inferioridade
João mora menos longe que (do que) Antônio.
Hoje escureceu menos cedo que (do que) ontem.

c) superioridade
João mora mais longe que (do que) Antônio.
Hoje escureceu mais cedo que (do que) ontem.

OBSERVAÇÃO
Melhor e pior são comparativos irregulares de bem e mal.
Rosa está cantando melhor do que nunca.
O pestinha do Toninho está cada vez pior.

2. Grau superlativo
O superlativo pode ser:

1. absoluto sintético - com o acréscimo do sufixo -íssimo: muitíssimo, pouquíssimo, pertíssimo, longíssimo, lentissimamente, suavissimamente etc.
Ele discursou muitíssimo bem.
Nós moramos pertíssimo do Museu da Independência.
A concertista canadense tocou suavissimamente.
NOTA
Com os advérbios em -mente o sufixo se pospõe à forma superlativa feminina do adjetivo do qual o advérbio deriva:
lentissimamente, suavissimamente, delicadissimamente, etc.

2. absoluto analítico - com o uso de um advérbio de intensidade: muito perto, muito longe, extremamente rápido, bastante devagar etc.
O médico disse que os marinheiros com intoxicação alimentar estão muito mal.
Ela fez tudo extremamente rápido.
Eles vieram de muito longe para consultar a tal vidente.

O superlativo apresenta ainda formas diminutivas na linguagem coloquial ou afetiva (com os sufixos -inho e -zinho): agorinha, cedinho, depressinha, devagarzinho, melhorzinho, pertinho, rapidinho etc.

Palavras denotativas
Certas palavras, por não se enquadrarem entre os advérbios, são denominadas palavras denotativas.

São palavras que não devem ser classificadas como advérbios, uma vez que não modificam o verbo, nem o adjetivo, nem outro advérbio.

As palavras denotativas indicam:

1. inclusão: até, inclusive, mesmo, até mesmo, também, ademais etc.
Até a vovó decidiu ir ao baile de Carnaval.
Todos estavam presentes à cerimônia, inclusive Mariana.

2. exclusão: apenas, salvo, senão, só, somente, fora, menos etc.
Dentre todos os associados, apenas Aloísio não compareceu para votar.
Todos ficaram felizes com a decisão, fora Maria, que protestou furiosamente.

3. designação: eis
Sem tê-la nos apresentado, João disse: eis minha noiva.
Eis-nos aqui novamente.

4.    realce: cá, lá, é que, só, sobretudo etc.
Conte-me cá todo o plano de viagem.
Diga-me lá o que foi que aconteceu.

5. retificação: aliás, isto é, ou antes, ou melhor etc.
Estou sem dinheiro, aliás, já devo um pouquinho ao banco.
Hoje é dia 22 de abril, ou melhor, de maio.

6. situação: afinal, então, agora, mas etc.
Não estou entendendo. Afinal qual é a sua proposta?
João não tinha aparência de camponês. Tinha mas era ares de aristocrata.
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Advérbios

Classificação dos advérbios
Os advérbios classificam-se de acordo com as circunstâncias que expressam. Há, na língua portuguesa, diversos tipos de advérbio:

1. de afirmação
sim, certamente, realmente, efetivamente, deveras, incontestavelmente etc.

2. de dúvida
talvez, quiçá, possivelmente, provavelmente, acaso, porventura etc.

3. de intensidade
bastante, bem, assaz, mais, menos, muito, pouco, demais etc.

4. de lugar
aqui, lá, aí, acolá, abaixo, acima, adiante, além, aquém, atrás, defronte, dentro, fora, perto, longe, onde etc.

5. de modo
bem, mal, assim, depressa, devagar, melhor, pior etc.
NOTA
São também advérbios de modo quase todos os advérbios terminados em -mente: delicadamente, negligentemente, rapidamente, suavemente etc.

6. de negação
não, nunca, jamais

7. de tempo
agora, hoje, ontem, anteontem, amanhã, cedo, tarde, jamais, nunca, logo, sempre, outrora, presentemente, raramente etc.


Advérbios interrogativos
Chamam-se interrogativos os advérbios que são empregados nas interrogações diretas e indiretas. Os advérbios interrogativos indicam circunstâncias de:

1. causa: por que?

Por que Maria não nos cumprimentou?
Nem imagino por que Maria não nos cumprimentou.

2.    lugar: onde?
Onde estão os meus óculos?
Não sei onde estão os meus óculos.

3.    modo: como?
Como anda o seu projeto de engenharia genética?
Gostaria de saber como anda o seu projeto de engenharia genética.

4. tempo: quando?
Quando será realizado o congresso?
Preciso saber quando será realizado o congresso.


Locuções adverbiais
São duas ou mais palavras que funcionam como advérbio. Em geral, os constituintes de uma locução adverbial são uma preposição + um substantivo, adjetivo ou advérbio. Exemplos:

às claras, às pressas, à toa, a pé, às escondidas, às vezes, de repente, de improviso, de propósito, de vez em quando, em breve, em cima, por atacado, por fora, por um triz, sem dúvida, sem medo etc.

As locuções adverbiais classificam-se como os advérbios. Podem ser de:
1.   afirmação
com certeza, de fato, por certo, sem dúvida etc.

2.   intensidade
de muito, de pouco, de todo, em excesso, por completo etc.

3.   lugar
à direita, à esquerda, ao lado, de longe, de perto, em cima, para dentro, para fora, por dentro, por fora, por perto etc.

4.   modo
às claras, à toa, a pé, às escondidas, às pressas, com ódio, em silêncio, por acaso etc.

5.   negação
de forma alguma, de forma nenhuma, de jeito algum, de modo algum, de modo nenhum etc.

6.   tempo
à noite, à tarde, à tardinha, de dia, de manhã, de vez em quando, em breve, pela manhã etc.


Formação dos advérbios de modo
Os advérbios de modo são formados juntando-se o sufixo -mente à forma feminina do adjetivo: calmamente, lentamente, loucamente, roucamente etc.

Numa sucessão de advérbios de modo, apenas o último registrará o sufixo -mente. Exemplos:
Ele discursou lenta e roucamente.
Todos lutaram rápida, angustiada e ferozmente.

Por outro lado, quando se quer realçar a expressão, repete-se o sufixo -mente:
Ele se aproximou da criança amigavelmente, suavemente, esperançosamente.
O pobre mendigo começou a comer rapidamente, ansiosamente, vorazmente.


Colocação dos advérbios
1. Os advérbios que modificam um adjetivo ou outro advérbio distribuem-se, em geral, antes desses:
O candidato está extremamente nervoso.
Você canta muito bem.

2. Dentre os advérbios que modificam o verbo ocorrem diferentes distribuições:
a) os de modo são geralmente colocados após o verbo:
As crianças corriam velozmente.
Todos se movimentaram lentamente.

No entanto, há ocorrências do advérbio no início da oração:
Rapidamente ele sacou a arma.
Delicadamente a bailarina atirou uma rosa para a platéia.

Devemos salientar que há uma certa liberdade na distribuição dos advérbios ou das locuções adverbiais de modo. Observe estas frases:
Cuidadosamente ela limpou todos os cristais.
Ela, cuidadosamente, limpou todos os cristais.
Ela limpou todos os cristais cuidadosamente.

b) os de tempo são colocados antes ou depois do verbo:
Sábado à tarde, fomos ao cinema.
Fomos ao cinema sábado à tarde.
Ontem choveu muito.
Choveu muito ontem.

c) os de lugar são normalmente colocados antes ou depois do verbo:
A esta cidade, jamais voltarei.
Jamais voltarei a esta cidade.
Aqui fora está frio.
Está frio aqui fora.

d) o advérbio de afirmação, usado em respostas, é geralmente colocado em posição inicial, antes do sujeito. Às vezes, aparece após o verbo:
- Você sabe onde ela mora?
- Sim, eu sei.
- Eles compraram aquela casa na praia?
- Compraram sim.

e) o advérbio de negação, usado em respostas, é normalmente colocado em posição inicial, antes do sujeito:
- Você quer um pedaço de bolo?
- Não, eu não quero. Obrigado.
- Vocês gostariam de um cafezinho?
- Não, agradecemos muito. Está muito calor.

Em outros contextos, o advérbio de negação antecede sempre o verbo:
Ele não sabia o que fazer com tanto dinheiro.
Aqui no Rio de Janeiro, não se trabalha durante o Carnaval.
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sábado, 21 de novembro de 2015

Oscar Wilde


Oscar Fingal O’Flahertie Wills Wilde nasceu em 16 de outubro de 1854 em Dublin, na Irlanda. O jovem, que mais tarde se tornaria uma referência na literatura inglesa do século XIX, começou a estudar língua e literatura grega em Dublin. Elogiado e premiado nessa área, conseguiu uma bolsa de estudos para estudar em Oxford no ano de 1874, onde também se destacou e ganhou prêmios, um deles em 1978, por seu poema “Ravenna”. Durante o tempo de estudo, Wilde fundou o Movimento Estético, que combatia a arte vitoriana e pregava o conceito da “Arte pela Arte”, uma atitude moral com brilho novo, sem apego a tradições. Depois de se formar, Wilde viajou para a Itália e a Grécia, indo em seguida morar em Londres no ano de 1879. Publicou nessa época seus primeiros textos clássicos. Aos poucos sua produção literária foi crescendo e Wilde se tornou uma figura importante nos meios sociais e literários de Londres. Publicou dois livros de contos, O Fantasma de Canterville (1887) e O príncipe feliz e outras histórias (1888), além deste único romance, O retrato de Dorian Gray (1891). Alguns livros marcaram sua carreira como dramatista, O leque de Lady Windermere (1892), Uma mulher sem importância (1893) e A importância de ser prudente (1895). Oscar Wilde era conhecido não só por seu trabalho, mas também por sua aparência física. Muito alto e de personalidade forte, vestia-se de maneira avessa aos costumes da moda, usando roupas coloridas e excêntricas durante festas e eventos sociais. Rejeitava a aristocracia e por isso gostava de chocar e de ter a liberdade de ser quem ele quisesse, sem regras e conveniências. Embora tenha se casado com Constance Lloyd, também irlandesa, e tido dois filhos, havia rumores em Londres de que Oscar Wilde fosse homossexual. No ano de 1895, enfrentou uma disputa jurídica contra o Marquês de Queensbury, que o acusou de manter relações com seu filho Lorde Alfred Douglas. Revelada a identidade de seu amante, Oscar Wilde foi condenado a dois anos de trabalhos forçados por homossexualismo. Durante esse período, escreveu um de seus poemas mais marcantes, publicado em 1898, “A Balada de Cárcere de Reading”, no qual descreve a vida na prisão, e um texto em forma de carta a Lorde Alfred chamado De Profundis. Morreu em Paris em 30 de novembro de 1900. Estava pobre e sozinho, abandonado pela família e os amigos, praticamente esquecido do grande público.

Noite na taverna


Noite na Taverna, de Álvares de Azevedo, é um livro de contos trágicos — lembram perfeitamente os contos de horror de Edgard Allan Poe, o genial escritor do Romantismo norte-americano — em que o real e o fantástico fundem-se para criar uma atmosfera escurecida pela fumaça dos charutos e pela pátina do meio sono entorpecido dos bêbados, devassos e impenitentes, que, reunidos em uma taverna lúgubre, desfiam suas experiências existenciais em narrativas escabrosas. A palavra vai de um personagem a outro e a cada intervenção de um deles, uma nova história surge, sempre ligada ao sofrimento, ao incesto, ao adultério, ao canibalismo, à prostituição.

JOHANN
Bem ao estilo da segunda geração romântica, o Autor cria um texto fantástico em que coincidências trágicas unem-se para, num somatório incrível de desgraças e de desencontros existenciais, destruir quatro vidas jovens que tinham tudo para viver em harmonia.
O enredo, mesmo com toda a dramática tragicidade, é de grande simplicidade:
"Johann joga bilhar com um jovem, desentendem-se por motivos fúteis, partem para um duelo e o oponente Artur morre estupidamente; Johann apanha no corpo do adversário um anel e um bilhete com um endereço, comparece a uma entrevista e passa a noite com uma virgem desconhecida; ao sair, é atacado por um homem, consegue eliminá-lo e depois descobre que acabara de matar o próprio irmão; volta ao quarto e constata que a virgem com quem tinha estado era sua irmã, noiva do moço com quem jogara bilhar e matara em duelo."
Como se percebe, a visão trágica da existência e o senso do mistério são presenças marcantes no texto: Johann em uma mesma noite mata o noivo da irmã e seu próprio irmão. Ao lado desses dois crimes hediondos. Comete incesto crime moralmente maior — com a irmã, em seqncia tenebrosa de acontecimentos sobre os quais não tem o mínimo controle. O acúmulo de coincidências fatais faz crer uma alma penada subjugada sob o fardo de seu carma. Não há, por conseguinte, qualquer possibilidade de redenção e Johann deverá consumir o resto de seus dias sob o peso esmagador de seus crimes e pecados.
Ressalte-se, ainda, o vocabulário e entonação reveladores da intensa emoção presente na fala da cada personagem. O tratamento cerimonioso, mesmo em situação crítica e explosiva, entre contendores prestes a se atracar confere, também, um clima de irrealismo e idealização excessivos que remete claramente para o gênero dramático. Tal texto, como já afirmou o grande escritor e crítico Adonias Filho, só poderia ter sido escrito no Romantismo, tal o grau de representatividade daquela estética abarcado por seus parcos limites.

SOLFIERI
Seguindo a linha da proposta da obra, este conto também fala da tragicidade da vida, da libertinagem e da depravação. O ambiente do narrado enquadra-se na perspectiva da preferência pelos lugares ermos, escuros, amedrontadores e os personagens que nele vagam são seres indefinidos dos quais apenas um impreciso contorno é mostrado. São mulheres e homens misteriosos e difusos num cenário também misterioso e difuso.
Solfieri, o narrador, é um dos boêmios reunidos na taverna e conta aos amigos a história fantástica por ele vivida na Roma misteriosa e perigosa das vielas e becos tortuosos. Numa noite, surge da janela escura de um palácio o vulto impreciso de uma mulher. Solfieri a segue até um cemitério e ali amanhece sozinho e desvairado.
Um ano depois reencontra a mulher dentro de um caixão, em uma igreja, despe o cadáver e o profana. Leva-o para casa. A mulher não está morta, mas apenas sofrera um ataque de catalepsia. Em casa ela se torna sua amante e morre louca. Ele a enterra em seu quarto, manda fazer uma estátua que a represente e coloca-a em seu leito de amante desesperado.
Hoje guarda como relíquia uma grinalda de flores murchas que arrancou da cabeça do cadáver da amada sem nome.

BERTRAM
Narrativa desordenada em que se mesclam o erotismo desenfreado, o assassinato, o canibalismo. Não há uma seqncia lógica e coerente dos fatos narrados, passando a ideia de um pesadelo nevoento em que os acontecimentos sucedem-se vertiginosamente sem que haja explicação lógica para eles. Bertram é o conto mais longo da obra Noite na Taverna e dá a impressão de que carecia de uma limpeza, ou seja, de uma depuração para que se tornasse mais compacto e menos cansativo.
Bertram, o protagonista, é um velho devasso com uma imensa carga de pecados e vícios para expiar. Relacionou-se, no passado, com três mulheres e nos três relacionamentos o amor físico é intenso, efêmero e de resultados devastadores.
A linguagem é tipicamente romântica, seguindo o tom declamatório e teatral de um longo solilóquio do protagonista-narrador.

CLAUDIUS HERMANN
Uma história absolutamente inverossímil em que Claudius Hermann apaixona-se por Eleonora, a duquesa, sequestra-a e confessa seu amor. A seqncia narrativa é desordenada e caótica. Não há um nexo ou uma razão a justificar as ações do narrador-protagonista. Mais uma narrativa erótica e misteriosa como os vapores nevoentos dos castelos assombrados das narrativas de terror.
Ao final o duque Maffio, desonrado e enlouquecido com o rapto de sua esposa, mata-a e morre sobre o cadáver.

ÚLTIMO BEIJO DE AMOR
A obra Noite na Taverna, como sabemos, é constituída com a representação de um grupo de homens, bêbados e infelizes, a desfilar narrativas escabrosas de fatos de suas vidas. O presente conto é o coroamento da obra. Seguindo uma técnica narrativa peculiar ao livro de contos, esta última história é o fechamento da obra. É o clímax da orgia e da bebedeira desenfreada.
Os personagens estão adormecidos e espalhados pelo chão da taverna. Beberam além da conta e exaustos entregam-se à letargia do álcool. Eis que chega um vulto fantasmagórico de mulher. É a própria encarnação da morte. A descrição tétrica ajusta-se a figura tradicional da ceifadora iniludível. Procura entre os bêbados até encontrar Johann e o executa. Volta-se para Arnold (o Artur que participara do duelo com Johann e, surpreendentemente, não morrera) e revela quem era: Giorgia, a jovem virgem desgraçada pelo irmão na primeira narrativa da obra que volta para matar o profanador e entregar sua miserável vida ao descanso final.

CONCLUSÃO

Um livro excepcional que tem encantado gerações e gerações de leitores ávidos por uma literatura emocional e profundamente representativa de nossos anseios de emancipação cultural. O Autor não só produziu um livro de contos, como também, de certa forma, deu cunho de definitiva autenticidade à novelística brasileira. A grande aceitação popular, particularmente do público jovem, como se pode atestar facilmente no convívio diário com alunos do Ensino Médio, comprova o valor desse jovem genial que, mesmo morto aos 21 anos incompletos, deixou uma obra de valor inquestionável.