"Olhai para os lírios do campo, como eles crescem; não trabalham, nem fiam. E eu vos digo que nem mesmo Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles".

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

O QUE SE PODE FAZER COM 23 LETRAS?

Nada.
Ou tudo.
Depende de quem as tem nas mãos e da maior ou menor habilidade em usá-las.
Alguns mal conseguem soletrar a, be, ce... Isso quando não estão absolutamente ausentes, e, nem chegam a entender o significado de cada um desses símbolos. Misteriosos demais para a pequenez do seu mundo.
Não é hora nem local para nos ocuparmos deles, estão à margem de todo e qualquer conhecimento.
Outros avançaram um pouco. São capazes de combinar as letras, ainda que bem primariamente, ainda que a duras penas, e conseguem criar alguma forma de expressão, mas não vão além.
Não chegam a perceber que têm nas mãos um tesouro capaz, se bem trabalhado, de produzir obras que poderiam atravessar séculos. Mas há os que olham para as 23 letras, com os olhos iluminados do lavrador que percebe no punhado de sementes que tem à sua frente a centelha da vida.
Simplesmente jogados uns ao lado dos outros, vistos com indiferença, os pequenos 23 sinais, como as sementes, jamais poderão germinar. Mas se caírem em terra boa, se receberem o estímulo da luz e o contato da água, acabarão por se transformar em árvores majestosas à sombra das quais tantos virão buscar refúgio.
Com 23 letras, apenas 23 letras, Shakespeare escreveu suas peças, Vinícius seus poemas, Eça seus romances, Vieira seus sermões.
Fernando Pessoa nem precisou das 23 para nos deixar este verso, talvez o mais belo já escrito em língua portuguesa:
AH! TODO O CAIS É UMA SAUDADE DE PEDRA.
Nem Garcia Lorca para dizer quase num sussurro:
A NOITE TORNOU-SE ÍNTIMA COMO UMA PEQUENA PRAÇA.
Quanta coisa se faz e se pode fazer com 23 letras.
Derrubam-se tiranos.
Propagam-se idéias.
Elevam-se e destroem-se crenças.
Exaltam-se os feitos heróicos.
Mudam-se os caminhos do mundo.
Ou simplesmente se enaltecem mulheres amadas.
Apenas 23 letras que têm estado à disposição de homens e mulheres, jovens e velhos de todas as gerações.
Apenas 23 letras, 23 sementes, tudo o que alguém precisa para escrever.
Basta encontrarem o solo fértil da decisão, água da perseverança e a luz do entusiasmo.
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Rubens Caruso

Um comentário:

Márcia disse...

Escritores, cantores, políticos, poetas ou simples amadores, usam 23 sementes que germinam e se transformam em complexas estruturas que muitas das vezes não podemos definir o seu real significado.
Palavras que brotam com capacidade de iludir, desviar e esconder o que há debaixo da terra, sua raiz, seu real motivo de estar ali.
Aí de nós, que não conhecemos estas sementes que estão nas mãos dos que envenenam nossas mentes.

Adorei seu texto, e....perdoe minha ousadia. Foi apenas um desabafo.